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A Linguagem Cósmica (segundo episódio)


O passarinho e a Lua - Edgar Duvivier

O passarinho e a Lua 

 

 


Um dos meus sonhos em criança era segurar um passarinho. Eles surgiam do verde das árvores e do azul do céu como uma delicada alquimia que só poderia ser apreciada à distância. Os que se podia comprar naquela época tinham que ser mantidos dentro de uma gaiola, e não permitiam contacto físico com eles.


Eu estava ainda aprendendo a falar, quando resolvi fazer um poema para um passarinho. Certa tarde em que eu olhava o céu pela janela do quarto de minha mãe, a gigantesca mangueira ao lado de nossa casa apareceu na minha mente com a imagem de um passarinho pousado em um dos seus galhos e se içando em voo.  Daí, nasceu o começo do meu poema, que recitei para minha mãe:


“O papainho voou, foi pousar lá na lua.


O trabaio do papainho é...”  E naquele momento de decidir, mais do que um trabalho, o que seria a missão do passarinho, lembrei-me de Eduarda, minha irmã mais velha, que eu muito admirava, e tive a imagem daquele mesmo bichinho pulando no galho da mangueira de um lado pro outro e formando com o ar transparente o nome dela. Completei meu poema:


“O tabaio do papainho é pular pa lá e pa cá o nome da Eduarda!”


Lembrei-me disso quando Marley, o passarinho que minha filha Olivia e eu tivemos durante catorze anos, deixou este mundo. Ele era um ‘conure’, nativo da America Central, e parecia um papagaio miniatura. Estava num hospital de animais porque tinha pegado um resfriado, e, pensando que podia se tratar de pneumonia, os veterinários disseram que ele certamente não sobreviveria nem a injeção que o sedaria para os exames que deveria fazer. Mas não tinha outra escolha, Marley deveria pernoitar lá para ser tratado.


No dia seguinte quando fomos visitá-lo, ele estava muito melhor. O jeito como mostrou amar nossa visita me fez pensar que em breve poderia voltar pra casa. Apoiou sua cabecinha contra o rosto de Olivia e, como sempre, permitiu que eu o deitasse na palma de minha mão, expondo seu peito vermelho para ser afagado. Disse a ele que todo aquele esforço tinha sido compensado, pois ele estava se recuperando bem. Enquanto me ouvia e era festejado, ele fechava os olhos em êxtase.


Compramos Marley quando morávamos em Madison, e ele se tornou uma fonte de alegria, humor, comunicação e afeto para Olivia e eu. Tornou realidade o meu sonho de segurar um passarinho, e muito mais. Era o máximo observar como um ser tão pequenino apreciava o amor que lhe dedicávamos, respondendo a ele com uma infinidade de pios em tons diferentes, vários movimentos de seu bico, e arrepiando suas penas. Ele até mesmo dava shows para nós. Uma vez, enquanto comentávamos sobre sua capacidade de se comunicar, ele, que estava empoleirado no ombro de Olivia, pulou para a cama dela, onde estávamos sentadas frente `a frente, e começou a desfilar entre nós de lá pra cá, estufando seu peito e empinando sua cabeça, com uma grandeza de orgulho, retribuição e importância. Revelava o quão honrado se sentia como se quisesse transmitir que merecia e apreciava nossa dedicação a ele. Seu ‘show’ era tão fofo que não conseguíamos parar de rir, e ele, de desfilar. 


Quando deixamos suas asas crescerem para que pudesse conhecer a experiencia de poder se erguer acima do chão e voar dentro de casa, ele aproveitou bem a oportunidade, aterrissando com frequência nos lugares mais altos como o topo das portas ou dos armários e olhando de cima para tudo que se passava.   Ainda morávamos em Madison quando Olivia bateu a porta de seu quarto, sem ver que ele estava pousado no topo dela, e ele sobreviveu. Fiquei horrorizada quando ela veio, tarde da noite, me mostrar o bico de Marley ensanguentado. Corremos para uma clínica veterinária de emergência, nosso passarinho foi examinado e o doutor disse que ele devia estar com dor de cabeça. Mesmo no pique da compaixão, tive vontade de rir, imaginando aquela cabecinha verde e que no seu tamanho tão pequenino podia se comunicar com a grandeza do amor, submetida a um diagnostico tão trivial nos humanos.


Pareceu-me impossível conceber uma dose tão mínima de remédio para a dor de cabeça do passarinho. Ainda assim, o veterinário conseguiu dar a ele a tal dose numa sala que não vimos reservada a pássaros, e nos disse que ele devia passar a noite lá mesmo, num incubador. Se não sobrevivesse, telefonariam pra nos avisar cedo na manhã do dia seguinte. Tomei um calmante pra dormir, rezei, e acordei às dez horas, aliviada por não ter ouvido nenhum telefone. Liguei para a clínica, e me disseram que ele estava pronto pra voltar pra casa.


Depois de cinco anos em Madison, nos mudamos para Boulder. O veterinário de lá nos avisou que pássaros são muito sensíveis e facilmente sucumbem a qualquer estresse. Devíamos esperar que Marley não sobrevivesse a mudança, coisa difícil até pra pessoas. Devíamos também esperar que nem o nosso apático cachorro Shih Tzu sobrevivesse. Decidi pagar um dos caras que empacotaram nossas coisas pra fazer uma viagem especial no seu caminhão lá de Wisconsin pro Colorado e trazer aqueles dois animais para o nosso endereço novo.


Meu marido, tipicamente americano, se torcia de vergonha ao me ouvir fazer essa proposta ao tal cara, nesta terra da especialização. Nunca cansou de me dizer que aqui não é Brasil, onde as pessoas são flexíveis a fazer ‘bicos’. “Mas são mais do que flexíveis a ganhar dinheiro extra!”, eu sempre respondi. De fato, o cara adorou a sugestão. Dei-lhe dinheiro pra pernoitar num hotel de estrada durante a viagem de dois dias, mas ele veio direto e chegou a Boulder muito mais cedo, com as pupilas dilatadas por ter dirigido durante a noite, entretanto são e salvo assim como seus passageiros.


Alvin, o cachorro, sempre foi estranho, e pirou com a mudança. Quando não o víamos lambendo as paredes da casa com devoção religiosa, era porque estava tentando escapar para uma rua movimentada na esquina. Acostumar-se com a altura e a menor quantidade de oxigênio de Boulder é algo que muitos não conseguem, e não era fácil lidar com um cachorro que se mostrava indiferente até `a sua comida.


Marley, por outro lado, não parava de cantar. Só não podia ficar solto na casa toda, porque Nala, a cadela que meu filho me havia dado ao mudar-se de Boulder pra California, queria caçá-lo. Mistura incrível de Rotweiller com shii stzu, sua inteligência, que lhe fazia perceber o quanto amávamos Marley, entrava em conflito com seu instinto, que lhe ordenava dar cabo do passarinho.  


Um dia, Oliva saiu apressada, esquecendo-se que Marley estava solto em seu quarto e deixando a porta aberta. Eu tinha saído, e Nala se sentiu livre para entrar naquele quarto e mastigar o passarinho. Quando Olivia voltou, encontrou-o sob a mesa de seu computador, sem cauda, sem metade de suas asas, e quase careca, mas ainda vivo. Achei que ia desmaiar quando vi suas costas cruas e vermelhas. Novamente corremos para uma clínica de emergência para animais. A veterinária disponível repetiu a mensagem que qualquer estresse mata passarinhos, ainda por cima um trauma como aquele.  Levou Marley pra uma sala de exames para ver se não tinha quebrado nada, o que felizmente não havia ocorrido. Nala, cujo maxilar já tinha partido muitos brinquedos densos de uma só vez, obviamente o poupou. Talvez ela se tenha ‘dito’ que só estava brincando com nosso passarinho, e assim conseguiu lhe dar a chance de se arrastar pra baixo da mesa.


A veterinária aplicou nas costas de Marley uma grossa camada de pomada branca, e colocou em torno do seu pescoço um funil de papel para que ele não bicasse aquele remédio. Mas o funil o desequilibrou e tornou impossível que ele se mantivesse sobre seus pés na mesa em que foi tratado. Tentando se libertar, Marley parecia um brinquedo de corda quebrado, num constante solavanco de um lado a outro que se tornava mais e mais patético e lamentável. Falei pra veterinária que aquilo sim era estresse, rasguei o funil e o tirei do pescoço de Marley. “Mas ele não pode bicar o remédio, tem que deixar durante oito horas que sua pele o absorva!” ela reclamou. “Se o funil, que é um verdadeiro estresse, não der cabo dele antes!” respondi, perplexa com tamanha falta de sensibilidade e saindo da clínica segurando Marley com delicadeza.


Para que o remédio ficasse intacto, mantive nosso passarinho entre minhas mãos em concha durante toda aquela tarde e, `a noite, coloquei-o entre meus seios e o apoiei com a mão direita sobre a minha camiseta. Eu e ele conseguimos dormir naquela posição, ele deve ter sido hipnotizado pelo som do meu coração, conforme um conhecedor de pássaros me disse depois.


De manhã, o remédio tinha sido absorvido e ele pôde se empoleirar dentro da sua gaiola. Pouco a pouco, suas penas, asas e cauda cresceram em cores super vivas. Para Marley, estresse não existia, pois sómente ser querido por nós tinha importância.


Durante os anos em que viveu conosco em Boulder, nosso passarinho sobreviveu as agruras de um inverno em que saiu pra fora de casa, quando um amigo de Olivia abriu a porta da casa sem saber que ele voava por ali. A neve era espessa, e Olivia o encontrou pousado no galho de uma arvore sem folhas, perto de nossa casa. Começou a chorar e confessou para um vizinho que ouviu seus soluços e se aproximou, não poder aguentar ver Marley congelando lá no alto daquele galho. O bom vizinho buscou um anzol para cutucar o passarinho pra fora do galho onde ele tremia de frio todo arrepiado, e assim ele desceu para as mãos de Olivia. Tinha se exposto à neve por uns dez minutos e já estava letárgico, mas se recuperou. Talvez só tivesse precisado saber que podia se tornar livre, fossem quais fossem as consequências.


Nosso passarinho nos revelou coisas lindas. Vivendo numa sala vizinha ao quarto de Olivia, ele podia sentir quando ela acordava através da porta fechada, e no minuto em que ela abria os olhos, ele começava a piar e a cantar o mais alto que podia. Reconhecer que essa percepção telepática vinha de outra dimensão significa tornar-se um pouco mais livre de nossos próprios limites. Apreciando e tornando-se disponível ao nosso afeto em circunstâncias totalmente diferentes das que encontraria na natureza, ele permitia que seu pescoço e sua barriga fossem acariciados, fechando os olhos e `as vezes abrindo o bico em total entrega.


Confiante o suficiente para cochilar ou simplesmente se deitar nas palmas de minhas mãos, ele mostrou que o amor é a única força que desarma, cura, e fala a qualquer ser vivo. Confirmou que é o maior poder porque o olhar do amor destaca o ser amado, não importa seu tamanho e espécie, como o mundo que ele é em si mesmo, resgatando-o do anonimato e lhe dando um pouco de eternidade. O amor é ressurreição, e sendo tão amado, Marley ressuscitou mais de uma vez.


Certa primavera, quando a natureza o embelezou para procriar, tornando suas penas mais coloridas e dando `a extensão vermelha de seu peito a forma de um coração, eu lhe disse que nada daquilo era em vão pois todos nós notávamos e admirávamos a sua beleza. Tenho certeza de que ele de algum modo me compreendia, enquanto me olhava do alto do lugar em que estava empoleirado. Mais um mistério: Tenho certeza de que ele ‘ouviu’ o que eu disse a Olivia quando ela me participou que ele havia partido, no dia seguinte da nossa visita à clínica em que estava internado com possível pneumonia, e onde nos pareceu estar se recuperando:


“O passarinho voou, foi parar lá na lua e de lá vai chegar ao paraíso!”


 

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A Cedro Rosa Digital, uma plataforma brasileira dedicada à certificação e distribuição de obras musicais, tem inovado ao utilizar os mecanismos dos Artigos 1-A e 3-A da Lei de Incentivo à Cultura para promover pequenos patrocínios em massa. Essa estratégia tem permitido o financiamento de importantes projetos culturais, como:

  • +40 Anos do Clube do Samba: Um documentário que celebra o legado do Clube do Samba, uma das instituições mais importantes na promoção do gênero musical no Brasil.

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Incentivos Fiscais: Uma Ferramenta Global de Fomento à Cultura e Entretenimento


Em todo o mundo, países utilizam leis de incentivos fiscais como uma ferramenta poderosa para fomentar a produção cultural, cinematográfica e televisiva. Essas políticas têm se mostrado eficazes não apenas para apoiar artistas e produtores locais, mas também para atrair grandes produções internacionais, gerando emprego e renda, além de promover o turismo cultural.


Exemplos de países líderes em incentivos fiscais culturais


Estados Unidos: Nos EUA, diversos estados competem para atrair produções oferecendo generosos incentivos fiscais. A Califórnia e a Geórgia são exemplos notáveis, com créditos fiscais que podem chegar a 30% dos custos de produção. Isso tem atraído grandes produções de Hollywood, como séries da Netflix e filmes da Marvel.


Reino Unido: O Reino Unido também é um grande player no campo dos incentivos fiscais. Oferece até 25% de reembolso nos custos de produção, o que tem atraído produções icônicas como a série "Game of Thrones" e filmes da franquia "James Bond".


Canadá: O Canadá é conhecido por suas políticas favoráveis, com créditos fiscais federais e provinciais que podem totalizar até 45% dos custos de produção. Toronto e Vancouver são destinos populares para produções americanas.


França: A França oferece um crédito fiscal de 30% para produções estrangeiras, incentivando a filmagem de produções internacionais no país. Este incentivo tem sido um fator crucial na decisão de filmar grandes produções em cenários icônicos franceses.


Como participar

Participar do financiamento desses projetos é simples e acessível a todos. Empresas e indivíduos podem destinar parte de seus impostos devidos para apoiar a produção cultural através dos mecanismos dos Artigos 1-A e 3-A. Esses artigos permitem que uma parte do Imposto de Renda devido seja direcionada a projetos culturais aprovados, proporcionando uma forma de apoio financeiro sem aumento de custos para os patrocinadores.


Para mais informações sobre como participar e contribuir para o desenvolvimento da cultura brasileira através da Cedro Rosa Digital, visite Cedro Rosa Digital.


A utilização de incentivos fiscais para a cultura é uma prática global que tem mostrado resultados positivos tanto para a economia quanto para a preservação e promoção das artes. A inovação da Cedro Rosa Digital em promover pequenos patrocínios em massa é um exemplo inspirador de como essas políticas podem ser utilizadas de maneira criativa e eficaz.


Referências:

  1. Tax Credits for Filming in California

  2. UK Film Tax Relief

  3. Canadian Film or Video Production Tax Credit

  4. France’s Tax Rebate for International Production


Essa matéria apresenta uma visão abrangente de como os incentivos fiscais têm sido usados globalmente para promover a cultura, com um foco especial na inovação da Cedro Rosa Digital no Brasil.


 

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