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Foto do escritorLeo Viana

AMO ESTA ISLA...


Cuba_Leo Viana

O maior risco que corremos quando ficamos muito tempo distantes dos amigos é a surpresa do reencontro. A pessoa pode ter engordado, emagrecido, perdido os cabelos ou ter mudado a cor deles, natural ou artificialmente. As piores surpresas costumam ser as subjetivas, de natureza interna, as psicológicas, ideológicas ou de saúde, muitas vezes não perceptíveis num primeiro olhar. Quem não se surpreendeu com o voto estranho de um amigo ou conhecido nas eleições recentes? 


Amigos próximos me relataram um caso de mudança de gênero que surpreendeu a todos. Nem foi possível apoiar a decisão radical e corajosa do amigo, agora amiga. E fica a lição de que não se deve manter afastados os amigos, ainda que creiamos naquela máxima de que a amizade resiste à distância. À distância talvez sim, mas nem sempre ao afastamento. E em tempos de contato permanente, distância e afastamento são coisas absolutamente diferentes.


Pois bem. Minha terceira visita à ilha que trato como uma parenta distante, mas querida, transcorreu praticamente sem surpresas. Visitei Cuba em 2008, 2015 e 2024, sempre na primavera de lá, a intervalos praticamente regulares. Sete e depois nove anos. A primeira visita foi para um evento oficial, o que deu a ela um caráter “chapa branca”. O prefeito de Havana era praticamente o guia, com direito a uma constrangedora furada de fila no embarque de volta e a visitas a locais como hospitais, postos de saúde, fazendas e casas particulares  que são difíceis de serem feitas sem apoio. Na segunda vez, fomos de casal. Andamos aleatoriamente por Havana e fomos a Varadero. Foi muito bom, mas com pouca objetividade. Era um passeio, talvez nem devesse mesmo ter objetividade, mas nos ressentimos de algum estudo prévio de pontos notáveis a visitar. Nem aos que eu tinha ido antes nós voltamos. Fomos conhecer Varadero na ocasião, repleta de turistas do mundo inteiro e peregrinamos por restaurantes de Havana, num tipo de turismo gastronômico que nos fez muito felizes. 


Cabe ressaltar que as duas primeiras visitas foram realizadas ainda sob os efeitos da elevação no poder de compra que experimentamos nos primeiros governos de esquerda.  Em 2015 a crise já se iniciara, mas ainda não era forte o impacto sobre as finanças da classe média.

Iniciada a conversa, falemos da última viagem. 


Numa demonstração prática do que eu disse no início, tenho amigos de mais de 40 anos de convívio. A manutenção de amizades assim faz um bem inaudito para a alma, tem uma função terapêutica que talvez rivalize com a penicilina, pra citar um remédio radical. O Rivotril não tem a menor chance.


Entre discussões sérias, conversas leves e os inevitáveis bate-boca que marcam nossos encontros, alguém propôs irmos a Cuba.  Viajavámos juntos quando éramos adolescentes, sob a supervisão de adultos sérios e responsáveis. Agora com todos no entorno dos 60 e eu, o mais novo, caminhando pra lá, a aventura não parecia oferecer riscos, salvo uma eventual crise de reumatismo. Que, aliás, não aconteceu! Aleluia!!


Pois bem. Três ou quatro meses de preparativos, uma substituição no time titular – sem a menor perda para o entrosamento e para a qualidade da equipe, cabe ressaltar - e fomos. Parte via Lima e parte, a minha, via Panamá. Sem sustos chegamos a Havana! Se houve alguma suspresa, foi ver que há voos regulares a partir dos Estados Unidos, o vizinho rico que mantém o criminoso bloqueio econômico que é  a principal fonte dos problemas estruturais da Ilha. Os vistos, por exemplo, continuam sendo avulsos para evitar o carimbo cubano no passaporte e a posterior má vontade dos ianques com quem tenha visitado a terra do Silvio Rodrigues. Nem que tenha sido só pra tomar um mojito e ver um show dele. Ou do Buena Vista.


As idiossincrasias do socialismo real seguem acontecendo, especialmente no estatismo forte. O Hotel Nacional, por exemplo, é estatal. Símbolo de glamour e status, tem preços proibitivos de hospedagem, mas absolutamente acessíveis nos bares e restaurantes, além de franquear o acesso às dependências comuns a todos os interessados, coisa que a iniciativa privada, nos espaços de luxo, normalmente não faria. Do alto de nossa simpatia pelo regime, comemos, a preços bem mais em conta que no Rio, pratos recomendados por gente como o Steven Spielberg e o Frank Sinatra. Fora o Marlon Brando, a Ava Gardner e o Caetano Veloso. Mas como ele volta e meia estaciona o carro no Leblon,  nem conta.


Não fomos a Cuba só pra comer, mas não dava pra passar sem. 


A situação atual de Cuba não é a melhor, como já não era nas viagens anteriores. 

Uma significativa queda no turismo após a pandemia e um agravante no bloqueio, com a doentia inclusão do país na lista dos países apoiadores do terrorismo pelos EUA (revogada durante nossa estadia lá!), fizeram reduzir a circulação de dólares, o lastro informal da economia, e criaram inflação, com evidente piora nos indicadores econômicos e sociais.


Pela primeira vez, foi notável a afluência de pedintes, gente em situação de necessidade que te aborda na rua em busca de doações de qualquer tipo. Eles estão principalmente nas áreas turísticas, em busca de dólares. Nada que não conheçamos profundamente. Há muitos anos abdiquei de comer em mesas nas calçadas do Rio de Janeiro. A sensação de desconforto é bastante semelhante. Alguém notou, acertadamente, que os pedintes de lá não moram na rua e geralmente não apresentam as mesmas sequelas que os nossos, tratados aqui por grande parte da população como vagabundos, mas derivados da desigualdade que exclui. Lá, numa ilha pequena e acossada por um vizinho rico e poderoso, o governo garante a saúde preventiva e as onipresentes escolas, que dão um colorido especial a toda a cidade, com alunos circulando por toda parte. 


A população é obviamente descontente com o que acontece. Tanto com as dificuldades impostas pelo regime já anacrônico e cheio de falhas incompatíveis com os rumos que a humanidade tomou (controle social, acesso limitado à informação), quanto aquelas derivadas, obviamente, do ainda maior anacronismo do bloqueio, que impede a chegada de fertilizantes para a agricultura, medicamentos, produtos alimentícios e outras necessidades fundamentais. A normalidade, de acordo com os centros de poder, deve estar na Arábia Saudita, que mata jornalistas e mulheres, mas tem petróleo e compra tudo superfaturado no feirão do comércio internacional.


Qualquer conversa na rua, com comerciante ou pedinte, garçom ou músico, profissional liberal ou taxista, te encaminha na mesma direção.


Sobre o que não perder em Havana, considerando que não fomos aos balneários mais badalados (uma parte da turma foi a Varadero. Eu, nas viagens anteriores, fui a Cayo Largo e Varadero), existe o óbvio (Catedral, Bodeguita, Floridita, Malecón, Hotel Nacional, Centro Fidel Castro, Museu da Revolução, Praça da Revolução e Memorial Marti, Cañonazo) e o nem tão óbvio, como concertos no Teatro Lírico, jantar em restaurantes em Vedado, passar o dia no Marea (perto da Marina Hemingway, a oeste de Havana), o Museu de Belas Artes, a maquete de Havana e uma lista de coisas muito interessantes sistematizada pelo Frei Betto, o brasileiro mais célebre em Cuba, numa disputa direta com os jogadores de futebol e o Lula. 


Outra fonte bem interessante de sugestões pra quem pretende visitar a ilha é o guia Lonely Planet. Se puder, consulte. Os velhos e charmosos carros (mas poluentes e sedentos...) seguem rodando, só que com a companhia cada vez mais intensiva de carros novos. Curiosamente, grande parte da frota está pintada de rosa. Não consegui saber se é o “efeito Barbie”, que atingiu com forte intensidade o mundo quase todo recentemente. Mas não descarto a hipótese. Alguém também disse que poderia ser efeito da maior disponibilidade e menor preço da tinta rosa. Mas é especulação.


Pra uma visita com claro viés ideológico, como foi essa, os valores da Revolução, com diversos problemas derivados de avanços tecnológicos não previstos durante a travessia a bordo do Granma, no acampamento na Sierra Maestra ou nas diversas tomadas de quartéis ao longo do trajeto de Las Coloradas (local do desembarque) a Havana, estão mantidos. 


Eu sigo me envergonhando profundamente do alto grau de analfabetismo e exclusão da sociedade brasileira, que naturalizou a miséria e a desigualdade. Em Cuba tá ruim pra quase todos (um pouco menos pra quem lida com o turismo e recebe em dólar, é verdade), mas a qualquer sinal de abertura – e eu sempre repito isso – tem-se à disposição uma mão de obra absolutamente qualificada ou com facilidade de qualificação, que domina dois ou mais idiomas desde o ensino básico e lê muito mais livros que a nossa juventude classe média idiotizada pelos smartphones, que em grande parte ganha consultórios de presente dos pais depois do curso superior e se nega a atender onde o povo mais precisa, nas periferias e interiores mais pobres. Nesses lugares aqui há inclusive muitos cubanos remanescentes do Mais Médicos, programa de governos passados. Frequentemente éramos abordados nas ruas por parentes de médicos que vivem no Brasil.


Fidel, Che, Camilo e os demais revolucionários e revolucionárias, inspirados por Marti, herói deles e dos contra também, iniciaram a construção de uma sociedade mais cooperativa, igualitária e humana, baseada na ciência e nas melhores premissas. As reformas agrária, habitacional e na saúde, cujos documentos iniciais estão expostos no Centro Fidel, deixam isso claro. 


O quase consenso aponta, no entanto, na direção contrária. Bom mesmo, de acordo com quem nos orienta quase o tempo todo, é o “todos contra todos”. A competição permanente. Ok. Basta olhar o que acontece em Gaza e no Rio Grande do Sul pra perceber qual  caminho parece mais promissor. E não me venha falar de paredón depois de quase trinta mil mortos em Gaza. Pode ser que eu reaja mal...


Eu sigo amando a ilha e seu povo feliz, diverso e musical, mesmo com todos os seus problemas. Assim como eu, com um pouco mais de dinheiro, eles resolveriam a maior parte deles.

E quem não gostar ainda tem todo o mundo pra visitar.

Eu prefiro não ter que passar tanto tempo sem voltar.

Viva la Revolución!

 

Rio de Janeiro, maio de 2024.


 

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