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CASALZINHO



A foto na rede social de encontros não revelava nada. O perfil talvez ainda menos, a depender do leitor interessado. O rosto quase inexpressivo e de óculos, numa foto 3x4 sem inspiração, daquelas que poderia ilustrar uma carteira do conselho de contabilidadeou o crachá de auxiliar administrativo num escritório de aluguel de copiadoras ou de banheiros químicos portáteis. Enfim, uma foto que não parecia querer inspirar romances, o que , em tese, seria a intenção precípua de quem se expunha no tal local virtual. Era assim que a Abigail – “Bibi”, para os mais próximos – esperava encontrar alguém interessante.


Do outro lado, olhando as eventuais possibilidades de encontro, entre ansioso epreocupado com a reação da mãe ultra protetora, que sequer desconfiava das intenções do filho único, o Marquinhos passava em revista o elenco de mulheres de todas as raças, origens, formações. Não era essencialmente maldoso ou mal intencionado. Queríamesmo alguém com quem se identificasse e não somente algum tipo de sexo casual, ainda que observasse que isto talvez fosse menos complexo de conseguir.


match entre os dois se deu de maneira mais atabalhoada que o razoável. Marquinhos se sentiu atraído por um grande elenco de meninas que não simpatizaram com ele. Não sabia se a causa era o rosto gordinho e a franja feita pela mãe ou a descrição do perfil, que falava coisas sobre ele desejar um “relacionamento sério com a anuência dos pais” ou ainda a referência feita ao mocotó que a mãe preparava como ninguém. 


Na sétima tentativa frustrada, resolveu alterar os parâmetros de busca e a primeira a aparecer foi a Bibi. A foto não revelava, conforme sabemos, mas a Bibi era bem bonita. Os olhos amendoados, a altura surpreendente e o corpo cultivado na prática do vôlei e da natação, apesar da timidez e da conversa quase lacônica, nada disso tinha sido captado pelas lentes do lambe-lambe que fez aquela 3x4.


Como dizem, “quem não é visto, não é lembrado”. A foto não ajudou e a Bibi passou praticamente despercebida aos olhos normalmente atentos do Marquinhos.


Em criança, um dos  maiores problemas do Marquinhos era exatamente o hiperfoco, que levou alguns terapeutas a desconfiarem de autismo. A adolescência fez o Marquinhos perder a atenção e isso parecia estar se resolvendo agora, na idade adulta e com a vontade cada vez mais forte de se tornar independente da mãe. Era engenheiro, estudou em boas escolas e passou pela universidade sem sustos, mas sem se deixar influenciar pelos bons ares do convívio com gente diferente. Afinal, a mãe... Foi inclusive contra a vontade dela que se empregou numa grande construtora, onde comandava equipes especializadas. Mas a general, em casa, mantinha o Marquinhos sob controle e jamais o deixava sair sem tomar o seu mingau e levar um casaquinho.


Numa segunda olhada no aplicativo, o Marquinhos não só percebeu a menina de óculos, como a discrição da Bibi passou a ser um ativo importante. A garota não se descrevia muito, não se expunha muito, não se fazia entender com a clareza que se espera em tempos de relacionamentos intermediados por aplicativos. Por alguma razão, achou que seria um perfil que facilitaria a relação com sua mãe. Deu um toque pra Bibi. Ela ficou entre surpresa e excitada. Gostaria de encontrar alguém legal, depois de já ter sido abordada por muita gente estranha. Talvez nem desconfiasse que a foto e a a descrição do perfil contribuíram pra essa sequência de infortúnios. Atrás de um telefone, tablet ou PC intermediário, as pessoas se tornam seres muito diferentes daquilo que o senso comum trata por “humano civilizado” ou aquele que poderia ser tranquilamente um signatário do Contrato Social do Rosseau. Viram seres violentos e odiosos, conforme se tem visto. Mas a índole mansa e alheia da Bibi nunca atentou pra essas coisas.


Após quatro ou cinco contatos via mensagem escrita, resolveram fazer uma ligação um para o outro. A iniciativa foi da Bibi, ao descobrir que o Marquinhos gostava de Lego. Os brinquedos de montar tinham sido a primeira paixão da Bibi. Nunca se interessou por bonecas. Queria ter sido engenheira de aviação, mas detestava a hierarquia e os dogmas das forças armadas e não teria como estudar num instituto da Força Aérea. Acabou arquiteta e relativamente frustrada com o emprego num tribunal. O salário era a única compensação. E a cada dia, mais frustrada e mais fechada em si, sentia sua tristeza aumentar. O aplicativo de paquera foi uma das formas de fugir desse poço aparentemente sem fundo. Afinal, ia continuar trabalhando e nem tinha a pretensão de voltar a ser uma arquiteta. No fundo, se sentia bem na burocracia.


A conversa foi um sucesso. Falaram de Lego, de expectativas frustradas na vida adulta, de terapeutas e terapias, mães possessivas e timidez.


Quase não sobra nada pro encontro físico, que não demorou muito pra acontecer. E amaram-se de um jeito que nem o mais ousado dos roteiristas talvez fosse capaz de prever, considerando a história dos personagens.


A família da Bibi anda super contente com o namorado inesperado e que de uma semana pra cá aparece todos os dias. E ela, saída do casulo, anda deslumbrante e confiante. Até a cor das roupas está diferente. A velha paleta preto/branco/cinza deu lugar a cores alegres, numa moldura bem mais atraente que a da Bibi do aplicativo.


A mãe do Marquinhos está desesperada porque ele saiu, deixou  o celular em casa e disse que ia trazer um filé pro almoço. Verdade que disse também que talvez demorasse um pouco.

Agora o celular descarregou, não tem Marquinhos, não tem filé e ela desconfia que alguma rapariga tenha abusado do seu menino inocente. 


A empregada da casa, ex-babá do Marquinhos, já não aguenta a ladainha. O Marquinhos liga pra ela secretamente várias vezes só dia, pra ter notícias da mãe. Ela, por sua vez,tenta convencer o rebelde a dar notícias diretamente, mas ele reluta. E ela segueacalmando a patroa, que tem tomado remédios pra dormir.


O Marquinhos não me deixaria assim!!, repete.


Ele disse que, quando completar 15 dias fora de casa, vai conversar com a mãe.  E vai morar com a Bibi.

A Bibi não sabe o que pensar sobre o assunto. Ama o Marquinhos, mas ele parece meio pirracento nesse problema com a mãe.


A única certeza, por enquanto, é a necessidade de terapia para os três!

Diz o Marquinhos que a mãe nunca aceitou a possibilidade de conversar com um(a) psicanalista.


A ver.

 

Belo Horizonte, setembro de 2024.


 

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