Como negar as mudanças climáticas?
A tendência da humanidade é sempre ignorar as consequências desastrosas de seus atos e escolhas, responsabilizando quaisquer outros fatores mesmo que inexistentes. Enquanto escrevo, a Califórnia arde de maneira assustadora, levando a cinzas casas, mansões e comércios, além de florestas com toda a diversidade de vida que ali habitava.
Parece reprise do ocorrido no Canadá no ano passado, 2024. Regiões imensas florestadas passaram de diferentes tons de verde a chamas amarelas e vermelhas, mas não do belo outono dos climas temperados. Essa devastação é rápida e irreparável – o que ardeu se foi – se perdeu para sempre.
A intensidade de incêndios tem sido cada vez maior. De 2021 a 2023, a perde de florestas no mundo pelo fogo aumentou em 5,6%, o que significa mais de 6 milhões de hectares de cobertura arbórea perdidos além do que já ocorria. Apenas em 2023, arderam 12 milhões de hectares, o equivalente a uma área do tamanho da Nicaragua.
No Brasil, apenas em 2024, foram registrados quase 280 mil focos de incêndios, um aumento de 46% em relação aos quase 190 mil ocorridos em 2023, de acordo com dados do programa BD Queimadas, do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). E a perda nas florestas tropicais é imensamente maior no que tange à biodiversidade. Em alguns locais do Brasil é possível encontrar até 300 espécies arbóreas em 1 hectare de floresta, o que equivale ao que existe em toda a Grã-Bretanha.
Outro evento climático extremo, como essas ocorrências desproporcionais têm sido chamadas, são as enchentes, que ocorrem cada vez com mais frequência sem aviso prévio. Aliás, avisos existem advindas de entidades científicas, que infelizmente são raramente ouvidas com a seriedade que merecem, seja por tomadores de decisão ou pela população em geral. Nesse momento, Minas enfrenta deslizamentos e mortes, assim como o Rio de Janeiro. Mas o sul do Brasil foi talvez o exemplo mais catastrófico e com proporções inigualáveis do que isso significa em termos de perdas de pessoas, infraestruturas e natureza que ali existia.
A devastação por enchentes também é rápida como o fogo, com recuperação demorada e danos muitas vezes irreparáveis. Enchentes têm se intensificado com imensas perdas como as que ocorreram em Petrópolis em 2022, na Baixada Santista em 2023-24 ou Teresópolis em 2024. Mesmo no Rio de Janeiro há registros históricos de enchentes desde os anos de 1700, com eventos em 1800, mas as mais devastadoras foram as de 1966 e 2011, quando favelas se desmancharam em lama deslizante.
O fato é que com o aumento da temperatura terrestre esses eventos têm ocorrido com mais frequentes e com maior intensidade, tanto no Brasil quanto no mundo. Todos sabem que não se deveria devastar florestas e nem construir habitações em encostas, mas quem mora nesses locais, na maioria das vezes, são pessoas sem opções ou perspectivas, que muitas vezes trabalham apenas para sobreviver. Essa não é uma norma geral, pois existem muitos projetos de mega organizações que também devastam e muito o ambiente natural. E claro, quem idealiza esses projetos e decide de levá-los adiante são pessoas muitas vezes “invisíveis”. Raramente respondem pelos seus atos.
Importante ressaltar, todavia, que a maioria dos desastres climáticos poderia ser evitada se a ciência fosse ouvida, ou se valores éticos pautassem as decisões tomadas. Por exemplo, como é que no Brasil existem favelas? A oitava economia do mundo não deveria permitir que essa realidade existisse. Enquanto as diferenças sociais forem aceitas como normais, com discrepâncias de salários entre os que mais ganham e os que menos ganham, esse cenário continuará a ser visto como “normal”.
No Brasil, um gestor recebe 14 vezes ou mais do que um profissional de nível técnico, quando em países desenvolvidos a diferença é de 4 ou 5 vezes. O salário mínimo do Brasil está em 51º lugar, quando comparado a outros países. A Suíça tem o mais alto de US$ 3.415 (R$ 20,500), enquanto ons Estados Unidos é de aproximadamente US$ 500 (R$ 3.000) e o Brasil apresenta míseros R$ 1.518 (US$ 253). Se fosse para acompanhar o 8º lugar na lista (como está no rank da economia) dos salários mínimos mundiais, o Brasil deveria ter o equivalente à França (que hoje tem o 8º maior salário mínimo), aproximadamente US$ 2.500 (R$ 15.000). Esses números escancaram uma realidade do Brasil como país injusto socialmente e aquém do que poderia ser (os cálculos foram feitos com aproximações, levando em conta R$ 6.00 para cada dólar).
Pode não parecer, mas essa realidade afeta diretamente o meio ambiente. Não que a pobreza seja a única causa da degradação e da perda da natureza, mas certamente contribui. Sem alternativas sólidas e sustentáveis de moradia, alimentação e saúde, o pobre vive e faz milagres com o pouco que ganha, e habita condições precárias como encostas de morros que desabam quando caem chuvas fortes, ou contrai doenças provocadas por contaminação de águas poluídas por esgotos despejados em rios, e tantos outros absurdos comuns pelo país afora.
O que poderia mudar significativamente as perspectivas de um futuro com direito a sonhos por uma maioria que hoje apenas sobrevive seria uma boa educação de base e educação profissional disponíveis a todos, o que exige planejamentos de longo prazo e investimentos maciços. Foi a educação que mudou o patamar de muitos países.
O Brasil, com toda a criatividade que tem o nosso povo, teria muito a ganhar num espaço de tempo relativamente curto. Precisamos deixar de ser um dos piores índices de analfabetismo funcional com incapacidade de raciocínios lógicos em matemática, se quisermos dar a chance a todos de desabrocharem seus talentos individuais em carreiras que melhorem vidas e ofereçam condições do próprio país se tornar uma nação digna de orgulho.
Mas, o que parece faltar é essa vontade de mudar, de transformar realidades duras para muitos e de salvar uma das mais ricas biodiversidades do mundo. Na hora das escolhas, o que tem sido comum é priorizar o que reforça o poder individual ao invés de melhorias para todos.
Fica cada vez mais claro que estamos chegando ao ponto de não retorno com as mudanças climáticas se intensificando, e o poder pode não fazer diferença em que mãos está quando os desastres acontecem. Todos podem padecer. Mas ainda há chances de se reverter a realidade atual se a ciência for ouvida. Negar as mudanças climáticas é negar a ciência.
Podemos trazer uma outra realidade com equilíbrio entre melhorar a vida de muitos e dar maiores chances da natureza se regenerar. Nesse momento da história planetária, o destino está nas mãos da humanidade. Vai depender de nossas escolhas e nossas ações.
Sustentabilidade e Economia Criativa: Um Alinhamento Necessário para o Brasil
O Brasil, com sua vasta biodiversidade, riquezas naturais e um potencial criativo sem igual, poderia se destacar globalmente como um exemplo de integração entre sustentabilidade ecológica e economia criativa. No entanto, essa conexão ainda parece subaproveitada. A criação de uma rede interligada que combine essas vertentes, incluindo música, cinema, artesanato, design, gastronomia e tecnologia, não é apenas uma oportunidade econômica, mas uma estratégia essencial para a valorização cultural e o desenvolvimento sustentável.
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Oportunidade de Alinhamento: Sustentabilidade e Cultura
Enquanto o mundo discute soluções para mudanças climáticas e desigualdades sociais, o Brasil tem a chance de liderar com práticas que valorizem tanto sua ecologia quanto sua cultura. Para isso, é necessário um esforço coordenado que envolva municípios, instituições públicas e privadas, e comunidades locais. Projetos de certificação de produtos sustentáveis, incentivo ao turismo cultural e a promoção de artistas e criadores podem criar um círculo virtuoso de desenvolvimento.
Cedro Rosa e a Plataforma CERTIFICA SOM
No campo da economia criativa, a Cedro Rosa Digital é um exemplo de iniciativa que conecta criadores com o mundo. Por meio do projeto CERTIFICA SOM, a plataforma digital está desenvolvendo um sistema que certifica e distribui obras e gravações musicais independentes, garantindo dados corretos sobre os direitos autorais e técnicos. Essa iniciativa gera renda para compositores e intérpretes, além de fortalecer o mercado cultural global. Entre os parceiros institucionais que colaboram com a Cedro Rosa estão EMBRAPII, Ministério da Ciência e Tecnologia e universidades como a UFCG, com destaque para o uso de blockchain e inteligência artificial no sistema.
Integração com o Audiovisual: Cinema e Séries
Além do foco musical, a Cedro Rosa também está envolvida em projetos audiovisuais que promovem a cultura brasileira, como a mostra O SAMBA ESTÁ AQUI, realizada em parceria com a produtora Artifício Cinematográfica. Outros projetos em desenvolvimento incluem o filme +40 Anos do Clube do Samba, em coprodução com a TV Cultura de São Paulo, e a minissérie História da Música Brasileira na Era das Gravações. Essas iniciativas não apenas destacam a riqueza cultural do Brasil, mas também geram empregos para diversas categorias profissionais.
A Necessidade de Redes Interligadas
Para que iniciativas como essas tenham um impacto significativo, é imprescindível criar redes vivas e interconectadas que funcionem de forma integrada em nível nacional e internacional. Municípios, governos estaduais e a esfera federal precisam criar políticas públicas que promovam essas conexões, unindo sustentabilidade ecológica e criatividade. A participação ativa de instituições privadas e organizações comunitárias também é essencial.
O alinhamento entre sustentabilidade e economia criativa é mais do que uma possibilidade; é uma necessidade estratégica para o Brasil. Projetos que já estão em andamento, como o CERTIFICA SOM e os filmes musicais, são exemplos de como essa integração pode começar a acontecer. Porém, para atingir seu potencial completo, será necessário um esforço coordenado, com visão de longo prazo e a valorização das especificidades regionais. O Brasil tem tudo para ser um líder global nesse modelo. Basta colocar em prática a criatividade e o potencial transformador de suas iniciativas.
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