Do desânimo à esperança.
A eleição de Trump representa perdas muito maiores do que “apenas” para os Estados Unidos, cuja influência mundial é inquestionável. É um risco planetário e a maioria não parece perceber. A fobia por petróleo o levou a utilizar a expressão “Drill, baby drill” (perfura, bebê, perfura), como base de sua campanha, além da idolatria por armas, e o uso de “fake news” sem qualquer comprovação.
Nada disso foi questionado por quem teve a coragem de votar nele.
O fato dessa tendência se repetir mundo afora não melhora a perspectiva de um futuro mais equilibrado. Muito pelo contrário, esperança parece pertencer a outro mundo que vem desaparecendo.
As evidências da necessidade de se implementar medidas emergenciais no nosso modelo de desenvolvimento são cientificamente comprovadas. Na área ambiental, hoje 75% das espécies estão em algum grau de ameaça de extinção. Muitas espécies já se foram para sempre e um número alarmante 43.500 milhões encontram-se no processo de desaparecimento (de acordo com a Lista Vermelha da IUCN), muitas em condições quase inviáveis de serem recuperadas.
Compara-se o momento atual com a 6ª extinção em massa, só que as demais levaram bilhões ou milhões de anos, e agora tudo está acelerado em decorrência de ações humanas.
As buscas por alternativas de energia limpa vêm crescendo, mas ainda em proporções aquém do que seria necessário se houvesse intenção séria de reduzir as emissões de gases de efeito estufa. Dados recentes mostram que os subsídios para a energia fóssil são seis vezes maiores do que é investido em medidas que evitariam danos, ou que poderiam mitigar os efeitos das mudanças climáticas. Aliás, o negacionismo nesse tema tem impedido avanços que deveriam fazer parte das agendas políticas globais.
A ciência não é levada a sério e estudiosos de temas importantes são raramente consultados quando os escassos planejamentos de longo prazo são elaborados. Acabaram-se os planos plurianuais para um território os para o avanço de determinados temas.
O imediatismo, a ganância, o egoísmo vêm acentuando a falta de empatia, o que torna o mundo atual desumano e insensível aos valores com base na ética e nos princípios de cooperação. É como se não houvesse amanhã. A única realidade que importa é o aqui e o agora.
Mas não no sentido que Huxley tão bem descreveu em seu livro “A Ilha”, onde os mainás gritavam “aqui e agora” continuamente, com intuito de lembrar as pessoas a valorizarem a vida com responsabilidade e foco no momento presente. E, a vida na “Ilha” era comunitária e com base na cooperação coletiva.
O cenário atual mostra uma reversão de valores que eu julgava estarem consolidados, além de haver uma negação em se adotar medidas apontadas como as mais adequadas para sanarmos os danos que nós humanos estamos causando ao planeta Terra.
Esse cenário tem deixado a mim e a muitas outras pessoas que conheço perplexas e sem ação.
Houve, de repente, um esvaziamento de esperança. É ela que está em extinção. Foi sugada de nós! E, com sua ausência, muitos adoecem, se deprimem e se perdem em uma escuridão sem paradeiro de ideias e sentimentos.
Se já havia o termo ecoansiedade, comum entre jovens que se veem sem perspectivas em um mundo que se mostra enfermo, agora a tristeza se alastrou para outras faixas etárias que se encontram com escassez de esperança por indícios de que o futuro promete ser desastroso. Os que não se sentem assim são aqueles que almejam tirar vantagens, ou os que creem em conspirações macabras e se sentem aliviados por termos sido salvos de um cenário aterrador que iria se instaurar. Ou seja, muitos acreditam em “fake news” e nem se dão ao trabalho de checarem a veracidade do que é dito. E quando o fazem, se baseiam em fontes duvidosas e sem respaldo científico.
Como sair desse sentimento de estarmos numa masmorra sem saída? Como angariar forças para seguir algum caminho de crescimento e de ações que melhorem as condições sociais, ambientais e econômicas, não apenas para alguns, mas para todos. Sim, porque os sonhos precisam ser gigantes em face aos crescentes desafios que não param de aumentar.
Cada um terá que buscar sua fonte de esperançar, caso se sinta perdido. Uns se apoiam na arte, outros no contato com a natureza, muitos com exercícios físicos e ainda alguns com contatos humanos nutritivos.
Em meio a esse dilema, tive a sorte de participar dia 12/11/2024, da celebração de 20 anos do Prêmio Empreendedor Social da Folha de São Paulo e Fundação Schwab, evento que pode ser comparado a uma injeção de esperança na veia. Como em todos os anos anteriores, a seleção dos candidatos mostrou ser criteriosa e altamente cuidadosa. O resultado sempre traz a público gente que transforma realidades nos mais diversos campos e muitas vezes em ambientes bem desafiadores. Eram duas categorias até esse ano, quando houve a adição de Jovens Transformadores (com até 25 anos) empreendendo em diversas frentes.
Os temas sempre variam bastante e esse ano não foi diferente. O ganhador na categoria Inovadores Sociais do Ano foi o ambientalista, Valmir Ortega, fundador da Belterra. Sua missão tem sido transformar pasto degradado em áreas produtivas com florestas que beneficiam gente e natureza. Um motoboy, Jorge Junior, criou um “banco”, Trampay, que oferece apoio financeiro a juros baixo, para que seus colegas possam circular tranquilos, sem começarem o dia com dívidas. E uma dupla de inovadores na educação, Luis Junqueira e Thiago Rached, fundaram a Letrus, que viabiliza o letramento de alunos de escolas públicas por meio de um programa de Inteligência Artificial, que corrige redações e aponta onde precisam melhorar.
Outra categoria de candidatos, Soluções que Inspiram, contou com a filha de um cobrador de ônibus, Simony César, que foi assediada diversas vezes quando estava em transporte coletivo, e sofreu violência física em uma parada de ônibus. Criou um programa para defender as mulheres molestadas durante percursos em ônibus, Nina, conseguindo apoio do sistema de transporte de Fortaleza, no qual é possível delatar com rapidez e eficácia o ocorrido e o ônibus é parado para que o agressor seja retirado da viatura.
Outro exemplo é Eduardo Ávila, que vem instalando energia limpa com placas solares cooperativas em favelas do Rio, já que o serviço oferecido é caro demais para os moradores, além de falhar com frequência. A Revolusolar vem contribuindo com uma drástica redução da conta de luz, que para 46% da população brasileira é a metade do orçamento familiar.
O último exemplo dessa categoria é de uma jovem jornalista, Maria Vitória Ramos, que descobriu a força da Lei de Acesso à Informação e criou, em 2018, a Fiquem Sabendo, que disponibiliza dados que nem sempre são abertos ao público. Com isso, descobriu informações incríveis como duplicidade de honorários pagos e outros absurdos, o que levou a economias vultosas aos cofres públicos. Seu grupo já influenciou mudanças em leis que facilitam o acesso à informação.
Finalmente, uma organização pioneira no empreendedorismo social, Ashoka, juntou-se ao Prêmio Folha para lançaram esse ano os Jovens Transformadores com um olhar para o futuro.
Nessa categoria homenagearam seis jovens com até 25 anos e os exemplos variaram entre Luiz César da Silva, fundador da Visibilidade da Juventude Rural, trazendo destaques a quem mora em zonas remotas de Alagoas, ou Rhayani Dias, co-fundadora da Politiqueiros, que insere os jovens em questões políticas do dia a dia, ou Mariana Nunes, criadora da Rede Autoestima-se, que trata de questões psicológicas dos jovens de periferia. Além desses, o Instituto Coca-Cola em parceria com Ashoka e Folha de São Paulo, trouxeram mais três destaques no protagonismo juvenil. Nos exemplos estão a inclusão de pessoas trans da periferia de Pernambuco, protagonizado por Luana Maria da Luz Barbosa, que criou a Pajubá Tech, abrindo portas para o mercado de trabalho, antes caracterizado apenas pela prostituição.
Um cearense, Rutenio Florencio fundou o Instituto Pensando Bem, que transformou um beco perigoso da favela onde mora em um ambiente de criação e soluções para problemas locais. Lá, ensina muay thai para evitar que meninos e meninas sejam abusados como ele afirma ter sido. Thais Rico criou a Mais1Code, escola de programação digital gratuita para a periferia de São Paulo, dando maiores opções profissionais para jovens de favelas que não conseguem arcar com investimentos para se capacitarem.
Os resultados gerais das transformações dos empreendedores socioambientais apoiados pela Folha/Schwab são impressionantes. Dados recentes mostram que os projetos selecionados como finalistas ou vencedores nesses 20 anos já beneficiaram dezenas de milhares de pessoas. O volume de recursos também é espantoso: 1,7 bilhão de Reais mobilizado apenas em 2023 pelos 101 empreendedores que responderam à pesquisa.
Minha fonte de inspiração para me ver livre do sentimento de perda e desânimo foi eficaz. A resposta pode não estar nos governantes dos países, sejam eles Brasil, Estados Unidos ou outros do mundo, mas em pequenas ilhas de transformação que estão ocorrendo em todos os cantos do planeta. Dar luz, visibilidade e atenção a esses exemplos pode trazer alento para nossas vidas que merecem bem mais do que a impotência que sentimos quando um político irresponsável e com muito poder é eleito. Temos que comer pelas beiradas, como mostram os empreendedores que menciono nesse artigo, ou outros de anos anteriores.
Claudio Padua e eu fomos honrados com o prêmio Folha/Schwab em 2009 e a emoção foi indescritível. O reconhecimento do que fazemos pela biodiversidade do Brasil e comunidades onde atuamos ter sido apreciado por instituições tão renomadas nos trouxe visibilidade e um “selo de qualidade”, que certamente nos ajudou a chegarmos aonde estamos com nossa instituição, IPÊ - Instituto de Pesquisas Ecológicas, hoje sem dúvida em outro patamar.
Importante ressaltar que o Prêmio foi entregue a nós, por termos sido os iniciadores dessa aventura, mas o mérito é de todos de nossa equipe, todos que ousaram se juntar a dois “malucos” e somar ao que já estava em andamento, ou iniciar seus próprios projetos que enriquecem o resultado geral da instituição.
Temos ainda o adicional dos alunos de nossa Escola Superior de Conservação Ambiental – ESCAS, que hoje atuam em diferentes partes do Brasil e alguns na América Latina, com base nos aprendizados que tiveram a chance de vivenciarem durante seu processo de formação.
Precisamos mesmo multiplicar multiplicadores que propaguem ações que protejam a vida em geral. Pode não ser suficiente, mas com certeza contribui para um mundo que traz esperança e não desânimo.
Criatividade, Ciência e Cultura: Vetores para a Sustentabilidade e Conscientização Climática
Música!
A integração entre Economia Criativa, Cultura e Ciência desempenha um papel crucial na conscientização global sobre a emergência climática. Esses setores geram conhecimento acessível, promovem mudanças comportamentais e criam soluções para estruturar uma economia sustentável. Projetos que unem criatividade e inovação podem fomentar emprego e renda ao mesmo tempo que educam a população sobre práticas mais conscientes.
A integração entre Economia Criativa, Cultura e Ciência desempenha um papel crucial na conscientização global sobre a emergência climática. Esses setores geram conhecimento acessível, promovem mudanças comportamentais e criam soluções para estruturar uma economia sustentável. Projetos que unem criatividade e inovação podem fomentar emprego e renda ao mesmo tempo que educam a população sobre práticas mais conscientes.
O portal CRIATIVOS! tem sido um exemplo prático desse potencial. Há quatro anos, reúne artistas, cientistas, economistas e intelectuais em uma plataforma dinâmica, fortalecendo a interatividade entre os segmentos criativos e promovendo debates sobre sustentabilidade e economia verde. A publicação da Open Society lancada atualmente, The Ideas Letter, com propósitos semelhantes, reforça a importância de iniciativas que conectam pensamento criativo e políticas públicas globais.
Escute essa playlist com Chico Buarque, Gilberto Gil e grandes artistas, na Cero Rosa / Spotify
A Cedro Rosa Digital, liderada por Antonio Galante, complementa essa proposta ao certificar e distribuir internacionalmente obras e gravações musicais. A plataforma promove diversidade cultural, gerando direitos autorais para artistas de cinco continentes. Projetos como o desenvolvimento do sistema CERTIFICA SOM, que garante crédito justo e direitos autorais internacionais, demonstram o compromisso com práticas sustentáveis e justas no mercado cultural.
Entre os parceiros institucionais que viabilizam essas iniciativas destacam-se a APEX, EMBRAPII, SEBRAE e o Ministério da Ciência e Tecnologia, além de colaborações com associações como ASCAP, SACEM e ECAD. Essas parcerias consolidam o impacto dos projetos na geração de emprego e renda, alinhando cultura e ciência a um futuro mais sustentável.
Para mais informações:
A importância dos direitos autorais como gerador de emprego e renda.
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