Economia Criativa x Economia da Cultura: diferenças, convergências e desafios
- Andréa Löfgren
- 8 de abr.
- 3 min de leitura

Os conceitos de economia criativa e economia da cultura ganharam destaque nos debates sobre inovação, desenvolvimento sustentável e políticas públicas culturais. Embora muitas vezes usados como sinônimos, eles carregam diferenças fundamentais quanto ao escopo, objetivos e estratégias (THROSBY, 2001; RUBIM, 2009).
A economia da cultura diz respeito a atividades econômicas ligadas diretamente à produção e circulação de bens e serviços culturais com forte valor simbólico — como, por exemplo, música, teatro, literatura, cinema e patrimônio (COELHO, 2009). Esse campo articula-se com a garantia de direitos culturais e cidadania, sendo um espaço de reconhecimento da diversidade e do acesso à cultura. No Brasil, esse entendimento influenciou políticas como os Pontos de Cultura e editais voltados a expressões populares e comunitárias (MINC/IBGE, 2022).
Já a economia criativa surgiu no contexto anglo-saxão, com destaque para o Reino Unido (DCMS, 1998), como resposta à busca por novos motores de crescimento econômico. Inclui setores como publicidade, design, arquitetura, moda, games, software e audiovisual, valorizando a criatividade como ativo econômico e a propriedade intelectual como motor da inovação (HOWKINS, 2001; UNCTAD, 2010). A ideia rapidamente se espalhou para organismos como a UNESCO e a WIPO e foi apropriada por países em desenvolvimento como estratégia de geração de emprego e diversificação produtiva (UNESCO, 2015).
No Brasil, a economia criativa foi institucionalizada a partir de 2008 com o relatório da FIRJAN (2008) e, em 2012, com a criação da Secretaria da Economia Criativasubordinado ao Ministério da Cultura. Mesmo após sua extinção em 2016, o conceito permaneceu vivo e voltou à pauta com a retomada da Política Nacional de Economia Criativa em 2023.
Enquanto a economia da cultura foca na preservação simbólica, diversidade e inclusão, a economia criativa enfatiza competitividade, inovação e empreendedorismo. Essa diferença impacta nas políticas públicas: a primeira prioriza o acesso, o patrimônio e os direitos culturais; a segunda, o mercado, a tecnologia e a exportação de bens criativos (SACCO, 2011; FLORIDA, 2002).
Apesar do potencial econômico de ambas, há críticas importantes. A economia criativa, ao priorizar segmentos urbanos e digitalizados (moda, audiovisual, startups), muitas vezes exclui comunidades tradicionais, coletivos periféricos e expressões culturais que não se adaptam à lógica de mercado (OBEC-BA, 2021). Isso aprofunda desigualdades regionais, raciais e de gênero.
Além disso, os trabalhadores criativos enfrentam precarização laboral, com vínculos frágeis, instabilidade e ausência de direitos sociais. A pandemia de COVID-19 escancarou essa vulnerabilidade, deixando muitos sem apoio emergencial. Outro problema é a mercantilização da cultura, que transforma expressões simbólicas em produtos, invisibilizando saberes tradicionais e não-hegemônicos (WIPO, 2022).
É nesse contexto que surge a necessidade de integrar as duas abordagens: combinar o potencial econômico da criatividade com os princípios de equidade, diversidade e cidadania cultural da economia da cultura. Isso exige políticas públicas estruturadas, investimentos de longo prazo, descentralização e escuta ativa dos sujeitos culturais (UNESCO, 2005; BUITRAGO; DUQUE, 2013).
Reconhecer as diferenças entre economia criativa e economia da cultura é fundamental para formular políticas públicas que valorizem a pluralidade cultural do Brasil. Mais do que escolher um lado, o desafio é construir pontes: fomentar inovação sem apagar tradições, gerar renda sem precarizar, promover inclusão sem mercantilizar. Afinal, cultura não é só economia — é identidade, memória e futuro.
Referências Bibliográficas
BAUMOL, William; BOWEN, William. Performing Arts: The Economic Dilemma. New York: Twentieth Century Fund, 1966.
BUITRAGO, Felipe; DUQUE, Iván. La Economía Naranja: una oportunidad infinita. Bogotá: Intermedio Editores, 2013.
COELHO, Teixeira. A cultura e seu inverso. São Paulo: Iluminuras, 2009.
DCMS – Department for Culture, Media and Sport. Creative Industries Mapping Document. Londres, 1998.
FIRJAN. A Cadeia da Indústria Criativa no Brasil. Rio de Janeiro: FIRJAN, 2008.
FLORIDA, Richard. The Rise of the Creative Class. New York: Basic Books, 2002.
HOWKINS, John. The Creative Economy: How People Make Money from Ideas. London: Penguin, 2001.
MINC/IBGE. Conta Satélite de Cultura 2017–2020. Brasília, 2022.
OBEC-BA. Relatórios de Diagnóstico da Economia Criativa na Bahia. Salvador: UFRB, 2021.
RUBIM, Antonio Albino Canelas. Políticas Culturais no Brasil. São Paulo: Anita Garibaldi, 2009.
SACCO, Pier Luigi. Culture 3.0: A new perspective for the EU 2014–2020 structural funds programming. European Expert Network on Culture, 2011.
THROSBY, David. Economics and Culture. Cambridge: Cambridge University Press, 2001.
UNCTAD. Creative Economy Report. Geneva: United Nations, 2010.
UNESCO. Convention on the Protection and Promotion of the Diversity of Cultural Expressions, 2005.
UNESCO. The Cultural Times: The First Global Map of Cultural and Creative Industries. EY, 2015.
WIPO. Creative Economy Outlook. Geneva: World Intellectual Property Organization, 2022.
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