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Foto do escritorLéo Viana

FIM DE ANO




Últimas horas da última sexta feira do ano. A confraternização tinha sido na semana anterior por exigência do gerente, que ia com o chefe pra Búzios, coisa já combinada havia tempo. Mas a Naná tinha deixado um último relatório por terminar. Enviaria ao gerente por mensagem pra aprovação ainda no fim da tarde, mais umas mensagens aos fornecedores e fecharia o escritório para as suas também merecidas férias. Tinha fechado há um tempão a ida com as amigas pra Foz do Iguaçu. Ia conhecer as cataratas, comprar umas coisinhas pra casa e ainda trazer umas bugigangas pra fazer uns trocados. O salário na empresa não era lá nessas coisas, apesar do ambiente bom. Tudo estava bem encaminhado e já passava das quatro da tarde quando a penultima pessoa, o Jorge, da contabilidade, se despediu e deixou com a Naná a responsabilidade total sobre aquelas duas horas até às 18, teto que ela mesma havia estabelecido.


A tempestade imprevista e não percebida a tempo desabou as 16:30h. O ambiente completamente isolado, a luz artificial, a temperatura e o som dos o som dos aparelhos de ar condicionado tornavam o escritório uma ilha de tranquilidade diante de eventos meteorológicos. A disciplina profissional da Naná impedia que ela olhasse notícias ou informações de qualquer natureza não relacionada ao trabalho durante o expediente. Naná era de absoluta confiança da direção superior da empresa, apesar do cargo subalterno. Era uma das quatro pessoas que tinham a chave da sala da diretoria e do portão. O sistema automatizado de segurança e a inexistência de valores em espécie no local tornavam dispensável uma segurança física.


A energia caiu quando um raio atingiu a clarabóia da sala de reuniões, que tem estrutura metálica. O grande lustre de cristal caiu, Naná se assustou e ficou completamente no escuro quando todas as luzes se apagaram. A clarabóia não era útil naquele momento, pois além de se situar no outro lado da edificação, as fortes nuvens de chuva causaram um efeito de eclipse e a escuridão era total. Naná conhecia cada centímetro do escritório como a palma da mão direita, mas não contava com o cabo do um velho PC que havia sido trocado de lugar naquele dia. Tropeçou, deu com a cabeça no chão frio e apagou imediatamente.


A soma do trauma com o cansaço acumulado pelos dias de trabalho intenso fizeram a Naná dormir por muito mais tempo que o normal. As amigas preocuparam-se com a ausência, mas sabiam que a Naná tinha um pouco de imprevisível. Parentes distantes, pais idosos morando longe. A vida da Naná era um livro aberto, mas grande demais pra ser lido assim numa folga. Viajaram sem ela.


Naná despertou com uma terrível dor de cabeça e com as roupas molhadas de suor e pela incontinência urinária, que já a incomodava há tempos. Olhou em volta, reconheceu o escritório, não entendeu direito o que estava acontecendo. O sistema de segurança não permitia a ligação automática da energia, de modo a não comprometer os sistemas. Assim, o calor infernal dificultava a percepção das coisas.


Uma desidratação também ameaçava a Naná, que sentia a boca seca como nunca. Levantou-se, tentou compreender o que havia acontecido, viu o fio grosso fora da tomada, a pequena CPU caída no chão, papéis esparramados, a sandália arrebentada. Formou uma imagem. Foi até a copa beber água e ligar o disjuntor geral pra voltar a ter ar condicionado. Uma fome terrível também a afligia, mas era regra não ter frigobar ou geladeira no escritório. Um chocolate na gaveta era o que havia. Comeu. Ia fazer hora até a roupa secar. O cheiro a incomodava, mas não morava longe o suficiente que não pudesse ir andando.


Em 40 minutos estaria na segurança de seu próprio apartamento, um dois quartos muito arrumadinho que comprara com a rescisão do emprego anterior. Sem entrar em transporte público ou carros de táxi ou aplicativos e sem ter que passar pelo constrangimento de ser questionada sobre a origem do cheiro de urina, se imaginava sã e salva. Num lapso lembrou-se do celular. O da empresa ela já tinha guardado numa gaveta depois de terminadas as tarefas do dia. Combinara com o chefe não levar assuntos de trabalho pro ano novo e não voltar em janeiro. Férias !! Mas o seu próprio aparelho não lembrava onde tinha colocado. Encontrou o aparelho caído atrás da mesa, descarregado e com a película rachada. Espetou o carregador e foi ao banheiro. Na volta, ao ligar o telefone, viu a data: 02/01/2024. E viu a hora: 06:23. Já era o primeiro dia útil do ano. As amigas viajaram sem ela. Não mandou memes de ano novo para ninguém. Nos aplicativos de mensagens, muitas mensagens impessoais de feliz ano novo e algumas de pessoas queridas. As amigas mandavam fotos de Foz do Iguaçu e lamentavam a ausência da Naná, mas diziam que entendiam que ela tinha uma vida atribulada, etc. Os pais, velhinhos tentaram ligar insistentemente, mas desistiram, imaginando que ela pudesse estar ocupada com algum namoradinho ou viajando com as amigas.


Passou um pano com desinfetante no chão e saiu correndo pra casa ante a possibilidade de que alguém chegasse pra trabalhar e a encontrasse ali, naquele estado.  Na saída, um porteiro do prédio vizinho a cumprimentou:


- Dona Naná! Feliz ano novo! A senhora não é mole, né? Já a essa hora. Funcionária exemplar!

Naná deu um sorriso amarelo, desejou feliz ano novo pra ele também e saiu.


Chegando em casa sem incidentes, já com as roupas secas, entrou na padaria ao lado pra pegar pão e mortadela. Se presentearia com um café ao menos. Ao retirar o cartão de crédito, o jogo do bolão da mega sena que havia comprado de um pedinte de restaurante caiu no chão.  Recolheu-o mais preocupada com o papel no chão que com um eventual resultado favorável. Levou consigo.


Café e banho tomados, situação sob controle, diversas ligações atrasadas e respondidas uma a uma, uma certa tristeza por haver perdido a viagem e algumas desculpas esfarrapadas depois, Naná foi conferir o jogo.

Os olhos brilharam quando acertou os três primeiros números.

Mas foi só.


O ano seria exatamente igual aos outros.

O caso é tomar mais cuidado com fios atravessados.

Ou não deixar relatórios para a última hora.

Tem uma semana pra pensar sobre as prioridades pro ano novo.

 

Rio de Janeiro, dezembro de 2023.


 

A interconexão entre educação, ecologia, cultura, ciências, artes e economia criativa revela-se como um mecanismo promissor para impulsionar comunidades em situação de marginalização.



Boletim Cedro Rosa.



Ao implementar programas educacionais abrangentes, que abordam não apenas os aspectos acadêmicos, mas também fomentam a consciência ambiental, habilidades artísticas e conhecimento empreendedor, indivíduos são capacitados a se tornarem agentes ativos de mudança em seus ambientes.


Investimentos em práticas sustentáveis e pesquisas científicas direcionadas para os desafios locais fortalecem não apenas a resiliência ambiental, mas também abrem caminhos para a inovação e o desenvolvimento de soluções adaptáveis.



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