top of page
Foto do escritorLéo Viana

INOCENTE



O clima na redação era o pior possível. O jornal era o preferido da classe média


intelectualizada, que se identificava com a esquerda. Os jornalistas, repórteres, revisores, a turma do chão de fabrica, eram maciçamente de esquerda. Mas o jornal acabara de assumir, em editorial de página inteira, a defesa da candidatura da direita.


E não de uma direita capitalista e liberal, no sentido  amplo e literal do termo, de costumes não moralistas e liberdade econômica, mas sim a candidatura de uma direita moralista, apegada ao fundamentalismo religioso, contrária radicalmente ao suporte do Estado a qualquer coisa, seja saúde, educação ou ação social.


O jornal, cuja família proprietária era historicamente alinhada com ideais pouco republicanos, pra dizer o mínimo, já vinha já muito descontente com as posições da maioria dos articulistas, que tinham levado o jornal na direção do público que agora era sua base.


A qualidade indiscutível dos textos e a ênfase em assuntos normalmente menos populares e mais complexos tinham feito o perfil dos leitores se alterar e o jornal ganhar projeção internacional ao mesmo tempo que via sua viabilidade comercial se comprometer, numa espécie de espiral de paradoxos.


Quanto melhor, menos lido; quanto mais internacional, menor o alcance comercial. Ao menos para o público que efetivamente interessa e consome por perto.


O clima de emergência começava a se instalar na sede, num importante edifício comercial do centro da cidade, longe da redação e do público. A matriarca cobrava do CEO, contratado a peso de ouro junto a outro importante veículo de comunicação, uma mudança de rumo. Não adiantava produzir pra uma elite, ainda que intelectual, e viver no vermelho, queimando lentamente o patrimônio acumulado ao longo de gerações.


O desinteresse dos herdeiros mais novos já  era um indicativo importante. Alguns optaram pelas artes (já eram dois músicos e um pintor, todos alternativos sem projeto ou perspectiva de sucesso ou ingresso no mainstream), outros dois pelo esporte e dois viviam em comunidades alternativas. Os dividendos ainda os sustentavam, mas a fonte não tinha a sustentabilidade de antes e ameaçava secar a qualquer momento.


A Bibi foi recebida como uma enviada dos céus. Consultora financeira de renome, indicada por outra família de negócios, chegou com a missão de devolver a confiança aos negócios do clã. Na reunião, com o CEO, a matriarca, que já passava dos 80 anos mas ainda mantinha a mão forte com a qual sempre controlou tudo, e seus dois filhos gêmeos idênticos de 60 anos e notável incompetência gerencial, a Bibi foi apresentada ao caso.


Tinha ouvido falar, mas morava no exterior havia muito tempo e não costumava acompanhar o que ocorria no Brasil. Tinha ido ainda jovem fazer  intercâmbio num programa da universidade em que estudava, mas a paixão avassaladora por um alemão a fez jogar tudo para o alto e ficar por lá.


Mais tarde, depois de uma separação traumática, exilou-se na França e graças à partilha dos bens acordada com o ex-marido, frequentava grifes de luxo. Numa dessas tornou-se amiga de outras ricas e em pouco, conhecedora da lida financeira, virou consultora.


A situação era verdadeiramente complicada. Preliminarmente, parecia se fazer necessário um reposicionamento do jornal. Além das mídias sociais, plataformas, etc, nas quais o veículo ainda não se apresentava direito, publicando apenas uma cópia estática da edição impressa, era fundamental mudar a abordagem dos fatos, as fotos, o layout. Tudo parecia anos 80 demais. Coincidentemente a época em que o jornal fez sua última reforma gráfica e de identidade visual.


Aos poucos, com a entrada de um time muito competente de jornalistas, o periódico foi se posicionando à esquerda do espectro e por lá ficou, agora lido por uma pequena parcela de leitores cujo poder aquisitivo era alto, mas isso não revertia em lucro para o jornal.


Alguma coisa precisava ser feita muito rapidamente, antes que tudo piorasse ainda mais. Antes que faltasse dinheiro pra remunerar os funcionários, que ainda não tinham sido alertados sobre a crise. Tudo parecia lindo, como sempre. Os leitores davam um belo feedback teórico . Gente letrada se comunica com o jornal, escreve belas correspondências pra seus articulistas preferidos.


A Bibi tinha qualidades inquestionáveis, mas ninguém se torna consultor financeiro por puro carisma e capacidade de diálogo. Propôs entrar com o pé na porta. As edições deveriam ser aprovadas e somente encaminhadas para a gráfica depois de um pente fino na sala da diretoria, com poder de veto e possibilidade de alteração total. Foi contratada uma equipe extra de diagramadores e convidados


influenciadores menos importantes - e mais baratos! - para auxiliar na empreitada. A gráfica em breve seria terceirizada, o que traria recursos (os contratos tinham sido renegociados recentemente e quase todo mundo era pessoa jurídica. As demissões seriam simples...).


A primeira edição revisada completamente após sair da redação foi a de um domingo.

A foto do prefeito da cidade na inauguração de um sistema inacabado de transportes entre o centro e a periferia, que marcava a posição oposicionista do jornal frente ao partido que governava a cidade com políticas de direita e populistas, foi substituída pela foto de uma modelo seminua. Esta, por sua vez, vinha ao lado de uma que trazia um acidente terrivel de trânsito, provocado pela fuga em alta velocidade de dois ladrões de carro.


Ao ultrapassarem um ônibus que parara no ponto, colidiram de frente com outro que levava crianças. O carro da polícia, que perseguia os ladrões, não conseguiu frear e acertou uma velhinha que acabara de saltar e atravessava a rua.


O jornal, que havia reduzido a tiragem dos fins de semana, teve que fazer edição extra, numa clara demonstração da possível recuperação. Os anunciantes se interessaram e a segunda foi dia de muitos telefonemas.


O editorial foi a cereja do bolo. Declarava, com todas as letras, que a coisa ia mudar e que dali em diante, estariam na linha de frente na defesa por uma sociedade radicalmente livre, armada, de valores religiosos arraigados, patriota e apegada a um ideal que passava, inclusive, por certo grau de segregação social e mesmo racial, ao defender a volta de projetos de colonização de base europeia e fechamento das fronteiras a imigrantes pobres de países vizinhos ou africanos.


A tomada de decisão pegou todo mundo de surpresa. A redação oficial parou. O público tradicional cancelou as assinaturas, políticos ligaram reclamando, políticos ligaram felicitando, pastores oraram a favor, pastores oraram contra. Falou-se no assunto como há muito não se fazia.


O jornal era tradicional. Os herdeiros mais desligados comemoraram a súbita volta ao imaginário popular. Isso traria mesadas mais substanciais. Os mais alternativos lamentaram a adesão ao padrão ainda mais conservador, no pior sentido.


A Bibi vibrou com o sucesso, contou com a súbita ascensão ao primeiro time dos consultores no Brasil. Tinha construído a carreira no exterior.


O padrão foi seguido, as equipes antigas foram desligadas, a foto com uma  mulher nua passou a ser obrigatória nas capas, as manchetes violentas viraram regra, os anunciantes voltaram, as vendas quintuplicaram.


Quando a Bibi acordou, em seu barraco na favela do Anjo Torto, se arrependeu muito de ter conversado com o cara metido a coach que tinha sentado em sua mesa no bar que virou pousada na favela.


Apesar de reacionário, falava bem e quase a convenceu. As teses nem eram absurdas, mas a Bibi tinha mais o que fazer.

Se algum dia tivesse de trabalhar numa reengenharia dessas, tinha convicção de que trabalharia no sentido contrário.


E em sua lógica, uma família manter um veiculo formador de opinião não faz o menor sentido.

Sabe de nada, inocente.

 

Guarani-MG, julho de 2024.

 

 

 Inovação em Filmes e Séries Musicais



A Cedro Rosa Digital tem se destacado como uma força inovadora na produção de filmes e séries musicais, aproveitando os incentivos da Agência Nacional do Cinema (ANCINE) para promover projetos que valorizam a cultura musical brasileira. Entre os projetos mais notáveis estão "+40 Anos do Clube do Samba", "Partideiros 2" e a minissérie "História da Música Brasileira na Era das Gravações". Esses projetos não só celebram a rica tradição musical do Brasil, mas também geram empregos e renda para centenas de profissionais da indústria criativa.


Projetos Destacados

  • +40 Anos do Clube do Samba: Em co-produção com a TV Cultura de São Paulo, este filme celebra mais de quatro décadas de um dos movimentos mais influentes do samba, reunindo depoimentos e apresentações de grandes nomes que ajudaram a moldar o gênero.



COMO APOIAR!

( qualquer valor )


Depósito direto na Conta do Projeto + 40 ANOS DO CLUBE DO SAMBA

Banco do Brasil - Banco: 001 - agência: 0287-9

conta corrente: 54047-1

PLAY PARTICIPAÇÕES E COMUNICAÇÕES LTDA - CEDRO ROSA

CNPJ: 07.855.726/0001-55


Conta OFICIAL verificada pela ANCINE.

Informe pela e-mail os dados e comprovante de deposito, para emissão do recibo


  • Partideiros 2: Esta continuação do aclamado "Partideiros" explora ainda mais o universo do samba, destacando grandes nomes do gênero e novas revelações. A série oferece uma imersão profunda na cultura do samba, suas origens e seu impacto na sociedade brasileira.

  • História da Música Brasileira na Era das Gravações: Esta minissérie detalha a evolução da música brasileira desde a introdução das gravações fonográficas, oferecendo uma visão abrangente e educativa sobre como a música gravada moldou a identidade cultural do país.


Patrocínios Incentivados

Empresas e indivíduos interessados em apoiar esses projetos podem fazê-lo através de patrocínios incentivados pela ANCINE, que permitem a dedução de 100% dos valores patrocinados no imposto de renda. Este mecanismo não só facilita o financiamento de projetos culturais, mas também proporciona benefícios fiscais significativos para os patrocinadores.


Certificação e Distribuição Musical: Garantindo Direitos Autorais


Além de sua atuação na produção audiovisual, a Cedro Rosa Digital tem se destacado no campo da certificação e distribuição musical. Utilizando tecnologias avançadas e uma rede global, a Cedro Rosa assegura que os criadores tenham suas obras registradas e recebam os devidos direitos autorais, independentemente de onde suas músicas sejam tocadas.


Impacto Global

A Cedro Rosa Digital certifica e distribui internacionalmente obras e gravações musicais, garantindo que compositores independentes de todo o mundo possam monetizar suas criações. Esta abordagem inovadora tem ajudado inúmeros artistas a receberem royalties e direitos autorais, fomentando um ambiente onde a criatividade é devidamente recompensada.


Contribuição para a Economia Criativa

A atuação da Cedro Rosa na certificação e distribuição musical não só beneficia os artistas, mas também contribui significativamente para a economia criativa. Ao garantir que os criadores sejam remunerados, a empresa promove um ciclo sustentável de produção cultural, incentivando novos talentos e a contínua criação de conteúdos originais.



A Cedro Rosa Digital, com sua dupla atuação na produção audiovisual e na certificação musical, emerge como um pilar fundamental na promoção e preservação da cultura musical brasileira. Seus projetos incentivados pela ANCINE não só celebram a rica tradição musical do Brasil, mas também oferecem uma plataforma para que novos talentos sejam reconhecidos e recompensados globalmente. Ao combinar inovação tecnológica com uma profunda apreciação pela cultura, a Cedro Rosa Digital continua a liderar o caminho para um futuro onde a criatividade é valorizada e sustentada

0 comentário

Commentaires


+ Confira também

Destaques

Essa Semana

bottom of page