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Foto do escritorPaulo Castro

O Jogo Continua


Paulo Castro, o Paulinho Cavaco

Diante do juiz, Giselda não olhou nenhuma vez para Adeilton. Ouviu os advogados dele e dela apresentarem os argumentos do divórcio e, agora, esperava a fala do juiz.


Ela e Adeilton se conheceram num baile de carnaval, no Esperança Futebol Clube e Regatas, em Bangu. Ninguém entendeu o Regatas, já que Bangu nunca teve praia. Foi, porém, uma sugestão de Dona Cacilda, esposa do maior bicheiro do bairro e presidente do clube. Ela achava chique. O nome foi para apreciação, sendo aprovado por unanimidade. Alguém duvida?


Ali começou o namoro, que passou para noivado e, a curto prazo, para casamentp. Ele, centroavante do Esperança, ídolo da torcida, artilheiro do campeonato, titular absoluto; ela, torcedora fanática do time, chefe de torcida, e, no momento, concorrente ao título de Miss Bangu, apoiada por Dona Cacilda. Já viu, né!


Zelda, apelido de infância, dava a maior força para o Ditão. Comparecia a todos os jogos, sempre vestindo a camisa com o retrato do marido, estampado, grande, dando aquela meia bicicleta que o Pelé tentou e não conseguiu.


E a partida final chegou. Disputa do título do campeonato. Zelda se preparou: acendeu velas em sete encruzilhadas, jogou flores no mar (pegou um Uber até o Recreio) e rezou cinco terços com Padre Cristovão, irmão de Dona Cacilda. Colocou a indumentária e, junto com as amigas, foi para a torcida.


O time adversário. o Atraso Futebol Clube, fez uma retranca forte, daí o nome do clube, já que o empate lhe daria o campeonato. Jogo duro, bola vai, bola vem, eis que a pelota surge, livre, na frente de Ditão, na meia lua da área. Ele e o goleiro. Isso aos quarenta e cinco do segundo tempo. O grito de Zelda ecoou pelo bairro: VAI,QUE É SUA, AMOR! E Ditão foi mesmo: o chute forte quebrou o vidro do relógio que ficava em cima da arquibancada, os estilhaços ferindo vários torcedores.


Em casa, Zelda aos prantos, cobrava: perder aquele gol feito! Na meia lua, na cara do goleiro! Ditão se justificava aos berros: a bola quicou! a bola quicou! Saiu do tempo e da batida! Tinha um buraco na grama! Ela quicou!


Em resumo: de lá pra cá, o casamento azedou e, agora, quando o papel, na frente do juiz, estava pra ser assinado, depois de um longo silêncio, Zelda se vira pro Ditão e pergunta baixinho: a bola quicou mesmo? Ele, triste de morrer, acenou com a cabeça positivamente. Zelda, então, disse: Meritíssimo, me desculpe, futebol é bobagem; amor, não! Vamos pra casa, Ditão? Saíram abraçados como centroavante e zagueiro quando da cobrança de um escanteio.


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