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O Mistério Sinistro de uma Vida de Amor Calado


fonte: Eleonora Duvivier
fonte: Eleonora Duvivier

 

   Nora, na sua ferocidade doce, já havia passado por poucas e boas nas mãos de quem largou ,ela num “killer Shelter” - asilos onde cachorros rejeitados são despachados pro outro mundo se não forem adotados dentro de algumas semanas.


Era fácil ver que ela havia associado qualquer contacto físico com humanos a alguma forma de maldade, pois estremecia quando era afagada de leve e logo escapava.  Mistura de pitbull, era difícil adivinhar que sua aparência agressiva escondia tanta humildade, e que ela, que a princípio podia assustar, aguentou tanto. Veio parar conosco porque Frank, um amigo de meu filho, a resgatou. Contou que ao ver Nora pela primeira vez no tal Shelter, achou que ela nunca seria adotada, pois enquanto os outros cachorros vinham pular nas grades como que se oferecendo `as pessoas que poderiam salvá-los, ela ficava lá no fundo do canil e parecia se esconder.


Foi assim modesta até o fim, não se achando merecedora de nada. Não ousava se dar o direito de pedir o que os outros nossos dois cachorros pediam, como alguma comida, ou de se deitar, como um deles, no meu cobertor elétrico. E vim a descobrir que ela adorava o tal cobertor, num dia em que estava sozinha no quarto e se colocou sobre ele. Dei-lhe parabéns, mas nem por isso ela fez daquilo um hábito. Mesmo sendo tão humilde, ela tinha a maior dignidade e podia avançar em qualquer cachorro que achasse ter lhe desrespeitado, fosse ele grande ou enorme.


   Chris não fecha a porta na cara nem de um amigo, nem de um cachorro. Como Frank passou a viajar por longos períodos, Chris então a revezava a paternidade de Nora com ele, nos intervalos mais longos entre as suas viagens. A última vez em que Chris foi buscá-la, há dois anos atras, ela estava imensamente deprimida. Frank tinha casado e se tornado pai, e toda sua atenção era para o novo bebê. Pensamos que Nora não fosse sobreviver, pois além de já ser idosa, no primeiro mês em que chegou, vomitava com frequência e se arrastava pelos cantos de nossa casa. Estava nervosa e insegura, mas como já conhecia Chris bem antes de nós, se permitiu confiar nele e amá-lo. Ele a chamava por “Fofinha” e ela, com todo o seu volume, até deixava que ele a carregasse. Mas nem por isso lhe pedia atenção quando o via com nossos outros cachorros, sempre se reconhecendo a última.  


   Chris passa metade do ano no Hawaii por conta de seu trabalho, e eu me tornei a principal responsável por Nora. Determinei-me a conseguir fazê-la dissociar os afagos que eu lhe fazia das agressões que levou na vida. O que fizeram com ela de tão ruim não tinha motivo; a crueldade sem face de quem o fez era tão repugnante que inimaginável. Eu não podia admitir que Nora mantivesse por toda sua vida os resquícios do mal, a lembrança da covardia, e a ferida da traição. Mas às vezes, quase desisti.


As suas reações de estremecimento e negação de qualquer demonstração de carinho físico pareciam marcadas nela a ferro e fogo. Entretanto, ela escolheu a minha cama onde dormir, e entrava no quarto com a confiança de ser bem aceita e encontrar paz. Percebi que curtia o conforto do meu colchão, o seu próprio adormecer, e o sono. Com ela, eu me dei conta da dádiva que é contar com um pouso firme onde se pode com segurança se entregar ao descanso e a inconsciência de toda a loucura do mundo; fazer uma pausa deste como que nos entregando ao segredo de nós mesmos, ao que é só nosso e nem a gente sabe direito, mas torna o dia seguinte inexistente. Nessas vezes, rendi graças ao me sentir ancorada perto dela, ou entre os três outros quando se juntavam a nós, durante o longo silencio da noite.


   Nora viveu uma eternidade através de seus sonhos, parecendo `as vezes galopar enquanto emitia latidos abafados, mas animados. Quando imersa na realidade onírica, ela parecia totalmente plena com o que estava vivendo. Aos poucos, percebi que logo antes de pegar no sono, ela ficava parecendo um filhotinho, nas posições, na expressão, e até mesmo as proporções de seu rosto pareciam mudar. Aí, senti que ela já podia receber carinho como se fosse mesmo um cachorrinho jovem.


Adorava então que certas partes do seu rosto fossem massageadas, como a testa volumosa, os lados de seu nariz, e os maxilares que tinham a forma de um queixo de cavalo, bem fofo. Ela sorria e ficava, com o seu bocão mostrando tantos dentes pontudos, um monstrinho lindo. E nessa linguagem sutil de mínimas mudanças de expressão e de barulhinhos diferentes que então fazia, ela estava agradecendo e deixando que eu soubesse que ela sabia que eu entendia.


É muito incrível sentir isso com um cachorro.


   Vivia imaginando como seria aquele filhote super bonitinho que ela foi um dia e que devia ter vindo logo pra nós. Não só imaginava ela como um jovem cachorrinho, mas também, pela aparência de suas tetas, pensava em como seriam as crias que teve. “Eu adoraria conhecer os seus filhinhos”, eu falava pra ela como quem fala pra uma menininha. Então, seus olhos redondos de melancolia, no seu olhar direto de coragem, se fixavam no meu rosto como se ela entendesse tudo.


Cachorro adora papear e saca muito mais do que nos damos conta porque entende além do que pensamos estar lhe dizendo.  Deve sentir, num tipo de pergunta como eu fiz `a Nora, o nosso cuidado com a sua vida, com o que fez, e com seu presente. Entende tão além da palavra que qualquer um deles percebe de imediato quando falamos sobre si, mesmo quando omitimos seu nome. Essa compreensão sem palavras toca o mais fundo de nós, o que é indizível.


   Nora começou a dormir mais e mais, suas costas foram encolhendo, e suas pernas começaram a ceder por causa de artrite. Enquanto isso, eu me preparava para o dia em que tivéssemos de acabar com seu sofrimento e com ela, que já teria terrivelmente virado só sofrimento. Vivia me preparando e me aproximando mais dela, passando muitos momentos dialogando com ela sobre qualquer assunto alegre.


    No seu último dia, ela ainda fez menção de querer ir com Chris e os outros dois cachorros para o parque. Mas no caminho ficou mal e sujou o carro todo, então voltaram. Chris anunciou que ela estava morrendo, e desmoronei. “Alguém faz alguma coisa!” eu gritava sem ter ideia do que esperava que fizessem. Chris chamou um serviço que vem em casa para dar termo `a vida do cachorro “com dignidade”. Parece que avisam ao dono se acharem que o animal ainda pode ser tratado.


    O veterinário viu logo que Nora estava nas últimas e justificou os sintomas que ela tinha pelo aspecto do seu corpo, como a atrofia dos ossos em suas costas, que segundo ele, causava o problema no intestino e daí a desidratação e vomito. Disse que em breve ela não conseguiria mais se levantar, e informou que quando isso acontece, os cachorros ficam com muito medo.


   Naquela mesma tarde, eu tinha conseguido contar quase que casualmente o que estava por vir, pra um amigo que apareceu de passagem. Horas depois, quando Nora já tinha partido, enrolada num cobertor velho que o veterinário trouxe e colocada na mala de um carro, pensei naquele recente passado e não me reconheci naqueles dois momentos tão próximos: o de ainda ter ela com a gente quando eu conversei com o cara, e o seguinte, quando ela já tinha virado ausência.


Achei absurdo haver consentido que lhe dessem um fim. Me considerei cega quando falei sobre o plano de despachá-la. Quis ignorar que não somos feitos para lidar com a finitude, com o absoluto, o irreversível. E só pude fazer isso porque Nora ainda estava com a gente. Enquanto um ser querido se encontra presente, a sua presença é eterna, e a sua morte, por mais próxima que esteja, não passa de uma abstração.


   Além disso, a realidade temporal esmaece e relativiza tudo que vive nela e está diante de nossa cara. Ter Nora conosco, relativizada pelo contexto - que naquele caso se tratava de aliviá-la - não deixava que ela fosse totalmente Nora e que eu sentisse por inteiro o amor que lhe tinha.


Naqueles momentos, o que contava era resolver seu sofrimento. Mas depois que ela virou um vácuo, foi atroz acreditar naquele “nunca mais” que falava por ela. E mesmo sabendo que a violência maior deve ter sido mais contra mim do que contra ela, nada mais podia me justificar.


    O vácuo que Nora virou, entretanto, fez o próprio amor que eu tinha por ela ressurgir com toda intensidade, já livre de quaisquer contextos e se revelando inteiro e maior do que nunca.


O vácuo liberta a alma do ser que engole, e a revela. Ao menos isso. Garante a sua realidade, a sua eternidade. Somos nós que ficamos pra trás.


Proust já dizia que não nos esquecemos dos mortos porque eles morreram, mas porque nós estamos morrendo.

 

Brasil Vive um Renascimento Cultural com Cinema, Música e Artesanato

O Brasil está passando por um poderoso renascimento cultural, impulsionado pela força criativa de seu cinema, música independente e artesanato. Este movimento celebra a diversidade e a riqueza da cultura nacional, enquanto incorpora inovações tecnológicas que ampliam o alcance e a sustentabilidade dessas expressões artísticas.


O Cinema Brasileiro em Destaque

O sucesso do filme Ainda Estou Aqui, vencedor de prêmios internacionais, é um exemplo claro do vigor do cinema brasileiro. A obra emociona ao explorar temas universais com uma perspectiva profundamente brasileira, comprovando que o cinema nacional tem voz ativa e capacidade de competir no cenário global.


 

Escute agora na Cedro Rosa a playlist Musica de Pretos do Brasil. Musicas disponiveis para download e licenciamento oficial. Fortaleça a rede!



 

Música Independente e Artesanato: Protagonistas do Renascimento

Além do cinema, a música independente brasileira e o artesanato ganham cada vez mais visibilidade. Artistas e artesãos de diversas regiões têm encontrado meios de divulgar e comercializar suas criações, reafirmando o papel dessas manifestações na economia criativa e na geração de renda.


Tecnologia e Inovação com o CERTIFICA SOM

A tecnologia tem sido um pilar essencial para otimizar e potencializar esse renascimento cultural. A Cedro Rosa Digital, com seu sistema CERTIFICA SOM, lidera a certificação e distribuição musical no Brasil e no mundo. Esse sistema inovador garante que músicas, compositores, intérpretes e toda a ficha técnica das gravações sejam corretamente registrados, assegurando o pagamento de direitos autorais e royalties de forma ágil e transparente.


O CERTIFICA SOM é fruto de parcerias com instituições de renome, como a UFCG, EMBRAPII, SEBRAE e o Ministério da Ciência e Tecnologia, além de contar com o suporte de associações como ASCAP, SACEM e ECAD. Esse ecossistema fortalece a cadeia musical independente, democratizando o acesso ao mercado global para artistas e criadores.


Mostra O SAMBA ESTÁ AQUI: Circuito Confirmado

A mostra de cinema O SAMBA ESTÁ AQUI, uma parceria entre a Cedro Rosa e a Artifício Cinematográfica, celebra o samba como patrimônio imaterial do Brasil. O projeto cria uma rede alternativa para a exibição de filmes independentes, promovendo a cultura brasileira em espaços como cinemas, cineclubes e centros culturais.

Com circuito já confirmado no Rio de Janeiro, São Paulo, Bahia e Espírito Santo, a mostra promete ampliar ainda mais sua presença em outras regiões, fortalecendo o acesso do público às obras que destacam a riqueza cultural do país.


Novos Projetos em Música e Audiovisual

A Cedro Rosa segue expandindo sua atuação com projetos que conectam música e audiovisual. Entre os destaques estão:

  • História da Música Brasileira na Era das Gravações: uma minissérie que explora o impacto das gravações no desenvolvimento da música nacional.

  • Partideiros 2: um filme que dá continuidade ao estudo da cultura do samba e suas raízes.

  • Produções Musicais: o lançamento de novos discos que destacam artistas independentes do Brasil e do exterior, certificados e distribuídos pela Cedro Rosa.



Cultura como Motor de Desenvolvimento

O renascimento cultural do Brasil reforça o papel da economia criativa como um motor de transformação social e econômica. O cinema, a música e o artesanato, aliados à tecnologia, geram emprego, renda e inclusão, além de projetar a identidade cultural do país no cenário global.


Investir em cultura e inovação é investir em um Brasil mais diverso, sustentável e conectado com o futuro.



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