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PLANEJAMENTO URBANO NO BRASIL – O CASO PETRÓPOLIS


José Luiz Alquéres, engenheiro

Sérgio Buarque de Holanda no seu magnífico livro Raízes do Brasil destaca como uma característica das cidades brasileiras fundadas pelos portugueses na época colonial a tendência de se acomodarem à topografia dos sítios que se estabeleceram por razões estratégicas ou comerciais. Ele fez um contraponto com as cidades de colonização espanhola, onde as Organizações Filipinas impunham um rígido tratado urbano, com ruas ortogonais convergindo para uma praça central, onde nos quatro lados estavam a catedral, significando o poder espiritual, o cabildo, significando as instituições da justiça e da ordem pública, o palácio do governador, significando o poder do rei, e o quartel militar.

 

Essa disposição espanhola ainda é identificada no centro de muitas cidades, mas pode-se dizer que, no mundo inteiro, o crescimento desordenado e explosivo da urbanização, a ideia que as atividades residenciais deveriam ficar separadas das comerciais e industriais, por serem mais poluentes, a criação de artérias de grande circulação de transporte público e, mais tarde, a introdução do automóvel, modificaram completamente o traçado das cidades, criando problemas de circulação, alocação das atividades, exclusão social de moradores de baixa renda, segurança pública e demais problemas que todos conhecem.

 

A sociedade digital, a inteligência artificial, os home offices, a produção comandada a distância, o imperativo de redução da poluição e outros fatores, apontam para um futuro diferente para as cidades. Os bairros acolherão atividades residenciais, comerciais e industriais e, ao mesmo tempo, uma maior quantidade de centros de lazer, cultura, saúde ou educação. Os deslocamentos deverão ser reduzidos, a bem de um melhor uso do tempo e menor poluição.

 

A transformação sugerida acima deve ser objeto da imediata preocupação dos poderes públicos e, para citar um exemplo, lembro de Petrópolis, cujo plano urbano do Major Koeller, de 1840, funcionou bastante bem até 1920, quando, a partir dessa época, sucessivos desvirtuamentos foram admitidos, resultando na atual caótica existência de 30 mil residências em áreas de risco de deslizamentos ou inundações. Para se ter ideia, isso corresponde a um terço do total de habitações da cidade.

 

A correção dessa situação de Petrópolis, de forma humanizada, impõe uma estratégia de ações continuadas ao longo de uns 20 anos. Essa estratégia deve prever consórcios intermunicipais para que as residências em áreas de risco sejam transferidas para locais de topografia mais favorável nos municípios vizinhos de Areal e Três Rios, onde o Vale do Piabanha é mais largo.

 

Do Centro de Petrópolis até esses novos bairros um transporte público eletrificado ou por ônibus movidos por combustível renovável deve ser estabelecido de forma gratuita ao longo desses primeiros 20 anos, sendo a antiga Estrada União e Indústria, a Estrada Mineira e trechos da antiga Estrada do Contorno constituírem-se a grande via de integração desses bairros e distritos, os quais deverão contar com todo o equipamento de infraestrutura física e social adequada para abrigar, com dignidade e diversificação, as populações deslocadas dos seus ambientes originais.

 

Um abrangente programa de ordem pública que, desde já, limite qualquer expansão urbana no município de Petrópolis, cuja população já excede a sua capacidade de ser sustentável, deve ser implantado, de forma simultânea.

 

A experiência mundial aponta que a gentrificação dos bairros remanescentes em Petrópolis contribui para seu aumento de arrecadação e capacidade de financiamento desse ambicioso programa.

 

Uma estimativa preliminar do custo de um projeto dessa natureza seria algo da ordem de R$ 5 bilhões, ou a grosso modo, R$ 250 milhões por ano, ao longo do período estimado de 20 anos, acima referido.

 

Pode-se admitir que um terço desse investimento seja efetuado pelas concessionárias de serviços públicos que fariam a urbanização das novas áreas e a extensão dos serviços públicos para as mesmas, evidentemente ressarcindo-se ao longo do prazo da sua concessão.

 

Outra terça parte dos investimentos caberia ao poder municipal que, para isso, complementaria recursos próprios com os que pudesse levantar nessa reciclagem de áreas urbanas, através de contribuições de melhoria e IPTU oriundas dos imóveis residenciais, comerciais e industriais beneficiados por esse processo.

 

O terceiro terço deveria provir dos governos federal e estadual, que gastam importâncias consideráveis todo ano em soluções paliativas, que ademais não computam o enorme prejuízo material das enchentes, deslizamentos, engarrafamentos e falta de segurança pública causados pela urbanização deficiente, nem tampouco o enorme valor intangível das vidas que se perdem e daquelas que jamais se recuperam das sequelas desses eventos extremos que só tendem a aumentar de frequência.

 

O maior desafio nesse caso é que os governos pensem no interesse maior da população e não somente nos objetivos de curto prazo dos seus mandatos, já que a solução exige no mínimo cinco mandatos de ações contínuas.



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