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Foto do escritorJorge Pontual

Seis sonetos de Michelangelo Buonarroti para Tommaso dei Cavalieri, por Jorge Pontual




Com os belos olhos teus vejo a luz clara que com os meus, cegos, já não posso olhar; com teus pés posso um peso carregar, o que pra mim, manco, é coisa rara. Com tuas asas pra sempre eu voara; com teu engenho ao céu posso chegar; fazes-me empalidecer ou corar, gelado ao sol, na neve, um Saara. O teu querer é só o querer meu, meu sentimento nasce no teu peito, no teu alento a minha voz busquei. Como lua solitária sou eu, que no céu não se pode ver direito a não ser que reflita o astro-rei.

Se um casto amor, se uma paixão paterna, se um só destino dois amantes casa, se o infortúnio a um e ao outro arrasa, se um só querer dois corações governa; se um’alma em dois corpos se faz eterna, ambos levando ao céu com a mesma asa; se o amor de um golpe só com ferro em brasa crava de dois peitos a carne terna; se amar ao outro, e a si mesmo não, com gosto e devoção, com tal mercê que se o que queira um, o outro ponha: se milhares sem fim são só fração de tal laço de amor, de tanta fé; só o pode romper fúria medonha

Sabes que eu sei que sabes, meu senhor, que vim para gozar-te mais de perto; sabes que eu sei que sabes o que quero: por que então não declarar o amor? Se a esperança que me dás tem valor, se bom e verdadeiro é o meu desejo, rompa-se o muro que entre nós eu vejo, pois força dupla tem a muda dor. Se só amo em ti, meu senhor querido, o que em ti mais amas, não fiques bravo; meu espírito ao teu está unido. Do engenho humano é mal compreendido o que em tua beleza almejo e gravo; quem quiser ver, melhor já ter morrido.

Vejo em teu belo rosto, senhor meu, o que narrar mal posso nesta vida: a alma, de carne ainda vestida, assim, há muito, a Deus ascendeu. E se o mesquinho e estúpido plebeu me acusa da sua gula enrustida, não é menor a gratidão vivida, o amor, a fé e o bom desejo meu. Daquela divina fonte se mostra toda a beleza que aqui se vê, mais que outra coisa, à pessoa de sorte; não há outro fruto nem outra amostra do céu na terra; por amar você transcendo a Deus e faço doce a morte.

Quero a mim mesmo, mais que no passado; por ter você na alma, mais eu valho, como o bloco de pedra que eu entalho mais do que a simples rocha é prezado. Ou como o papel escrito ou pintado tem mais valor do que qualquer retalho, também eu, um romântico grisalho, pelo amor ao teu rosto fui marcado. Seguro em toda parte, em desafogo vou, como quem, por fé ou armas ter, diante do perigo vai sereno. Eu valho contra a água e contra o fogo, Com teu olhar os cegos faço ver, e meu cuspe cura qualquer veneno.

Não sei se é a desejada luz, vinda do Criador, que a alma sente, ou se é pela memória da gente que outra beleza o coração traduz; ou se fama, ou se sonho, alguém produz, aos olhos e ao coração presente, de si deixando um não-sei-quê tão quente que é o que a chorar me conduz. O que sinto e que busco e que me guia meu não é; e não sei bem ver a meta que achar eu possa com os olhos meus. Desde que o vi, senhor, tal fidalguia, um doce-amargo, um sim-e-não me inquieta: Terão sido decreto os olhos seus.



Michelangelo tinha 57 quando conheceu Tommaso dei Cavalieri, 23. O artista escreveu cerca de 30 poemas de amor para Tommaso, na maioria sonetos. A relação durou 32 anos. Michelangelo morreu nos braços de Tommaso.

 

Jorge Pontual é jornalista e tradutor.


 

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