SER PEDRA
Havia dias em que as letras não lhe fixavam,
as músicas não lhe falavam,
e até a água, esquecia de beber,
preocupada que estava em entender suas tristezas.
Caminhava entre plantas e gatas famintas,
entre gatas e roupas por estender,
entres roupas e comidas por fazer.
Se levantava da cadeira e ia até a janela,
numa esperança vã por novidades.
A visão era bela,
de um distante mar batendo mais forte, mais fraco.
Sustentando céus azuis ou nublados,
desmanchando o sol, emoldurando a lua.
Tudo pleno de poesia,
mas uma poesia que se repetia, virava tédio,
pois até as poesias se cansam de poetizar.
E nesse marasmo repetido,
Uma, outra, e outras vezes,
lhe vinha à cabeça um desejo:
Como ela queria ser pedra.
Sim – como queria ser uma pedra.
Estar solidamente assentada
de frente ao vento, ao mar, ao luar,
espectadora do tempo,
rindo de sua a pressa,
da sua inexorabilidade – palavra difícil,
que pouco importa para quem é pedra,
pois a destruição,
ocorre aos poucos,
não no tempo,
mas no espaço,
nos volumes expostos do corpo pedra.
Mesmo assim,
como deve ser bom ser pedra!
Uma pedra nem grande, nem pequena.
Fincada o suficiente para não deslizar.
Somente uma pedra
pode observar as figuras momentâneas
costuradas lentamente pelas nuvens,
enquanto sente o ziguezague das gotas de água
nas ranhuras de suas veias de pedra.
Somente uma pedra
vê o rasgar da tarde pela lua,
ouve o farfalhar das folhas,
e reconhecer a chuva, não por sua intensidade,
mas pela elegância do cair de seus fios.
Somente uma pedra admira intensamente
a leveza de uma névoa qual organza na pele,
sente o peso aveludado da nevasca,
se perde no tule delicado da neblina,
e brinca com as rendas do orvalho.
Sim, era essa a solução: ser pedra.
E foi assim, nessa divagação solitária,
que ela saiu
e comprou uma máquina de costura.
A Música e a Cedro Rosa: Impulsionando o Desenvolvimento na Economia Criativa
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