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É CARNAVAL, ARISTIDES!

Foto do escritor: Léo VianaLéo Viana

Leo Viana

Perdera a conta! Outra vez o mesmo sonho, que o atormentara e fizera acordar sobressaltado dezenas de vezes nos últimos anos e durante a pandemia.


Acordava chorando, algumas vezes empapado de suor ou mesmo daquele outro líquido. Alguma incontinência também já acompanhava o Aristides. A vida longa é um benefício, mas tem ônus.

O trecho final do sonho se dava geralmente em algum lugar cheio de gente, sempre na expectativa de que algo muito surpreendente aconteceria, mas nunca alcançava a resposta. Acordava sempre antes. As sequências eram imprecisas, um tanto caóticas. Grupos passavam por ele solidários com o seu aparente desconforto. Outros zombavam. Não estava claro se estaria nu ou mal vestido. Um dos desafios a que se propusera era exatamente entender porque ninguém ficava indiferente a ele.


Em carnavais passados, ao som das marchinhas imortais de Lamartine, Braguinha ou João Roberto Kelly, saía sempre vestido de bermuda e camiseta, de modo a não despertar nenhuma atração especial. Levava o carnaval a sério, sem envolvimentos românticos. Eram dias de festejo e celebração, mas importantes, quase científicos. Observava e até se divertia, mas não dividia com ninguém. Sonhava um dia escrever essas memórias. Tinha até um título provisório: “Carnaval Solitário”. Muita história pra contar de festejos na multidão, mas sem mais ninguém. Viu coisas inimagináveis, boas e ruins. Estava na ativa desde os antigos blocos de sujo. Viu as grandes escolas de samba na Rio Branco e na Presidente Vargas. E passou por tudo sem um beijo, sem um afeto fisicamente manifesto de qualquer natureza. Nem amor nem ódio.


Assim foi, aliás, grande parte de sua vida. Viveu quase sempre só. Desde que abandonou a casa dos pais, aos quinze anos, e veio do Amapá para o Rio. Um misto de patologia psíquica com antipatia simples. Não era de todo má pessoa, no entanto. Votava em quem defendia justiça social. Preferia que os pobres não o incomodassem. Temia se fragilizar em seu projeto de solidão voluntária. No trabalho, se relacionava quase normalmente. Trabalhando a vida toda no mesmo banco, onde fez uma carreira relativamente bem sucedida, nunca chamou a atenção por especial competência, mas nunca decepcionou a chefia e foi assim que permaneceu no mesmo setor por intermináveis trinta e cinco anos, até a aposentadoria.


Os pais já haviam notado a estranheza do pequeno Aristides. Nenhum amigo próximo, nenhuma namoradinha. O desempenho escolar não era ruim e a escola não via nada de excepcional. Males da escola conservadora em que o pequeno estudara desde o início do ensino fundamental até o início do ensino médio. Já no Rio, matriculado numa escola pública sem maiores recursos, entrou sem sustos no curso de administração de uma universidade federal. E foi nessa época que iniciou sua grande e solitária aventura carnavalesca. Não se interessava sexualmente por homens ou mulheres, apesar de uma identificação com a postura masculina, que adotará como norma para a vida toda.


Neste momento da vida, no entanto, mesmo com uma velhice relativamente confortável, importava se defender do sonho recorrente, do incômodo insistente que causava em quem tinha conseguido se manter isolado num mundo tão cheio. Era o vizinho que ninguém notava, o ausente das reuniões de condomínio, mesmo mantendo as contas rigorosamente em dia. Era aquele que as pessoas não conheciam. Evitava os elevadores e as áreas comuns. Jamais foi visto papeando pelos corredores. Mantinha uma relação tão cordial quanto possível com porteiros e outros empregados com os quais cruzava. Não fazia comidas que atraíssem o interesse da vizinhança, não recebia visitas ou correspondências.


E aguardava ansioso pelo carnaval, onde desfilava anônimo pelas ruas muitas vezes sem nem mesmo voltar em casa. Podia ficar num motel sujo da Central ou num hotel melhorzinho da Zona Sul, mas apenas dormia e voltava a andar no dia seguinte, entre as multidões que se esbaldavam sem ligar pra ele. Tantos anos depois, já não tinha o mesmo vigor físico e andava apenas pelos arredores, não se dando mais ao luxo de percorrer grandes distâncias ou de se aventurar por locais menos seguros. Mas seguia gostando do esporte. No fundo queria ser como aquelas pessoas, que se entregavam à alegria simples, ainda que meio exibicionista. Ele não conseguia, tinha limitações demais, travas internas, medos ancestrais. E o sonho parecia querer romper com a proposição.


No sonho não conseguia saber o que vestia, apenas se incomodava com o fato de todos repararem nele. Estaria nu? Provavelmente não. Mas e se estivesse? A dúvida o atormentava. Queria continuar sendo o anônimo que sempre fora. Morreria se o notassem, imaginava. Não queria qualquer forma de celebridade, não queria qualquer destaque, nada que o diferenciasse numa multidão, nenhuma marca particular. Vestia-se com a discrição do bege eterno, do jeans mais comum, do tênis sem cor. E as bermudas de carnaval eram tão básicas quanto deveriam ser para não serem notadas por falta ou excesso de atitude. Nada justificava que o olhassem daquela maneira, que o observassem mais do que às demais pessoas.


O sonho persistia, se tornava um pesadelo. Mil assombros vinham com a força da quebra não prevista - nunca nem imaginada - de um paradigma dessa magnitude. Queria continuar sendo quem sempre fora, notando sem ser notado, observando sem ser observado. A indiferença alheia, cultivada a um alto custo pessoal, com o sacrifício de toda e qualquer sociabilidade, era para ele um valor indissociável de sua própria personalidade.


Não aguentava mais sonhar com isso. Foram anos de muita angústia e sofrimento, complementados com o sonho ameaçador e revestido de uma estranha camada de realidade quase palpável. Não conseguia olhar para a própria roupa, a ponto de não saber descrever o que vestia, se indagado fosse.


Caminhava, tentando repetir o que fazia sistematicamente havia tanto tempo. Olhava as pessoas nas calçadas, que por sua vez olhavam as fantasias umas das outras. Faziam, nos blocos, os papeis de críticos e artistas, simultaneamente.


Havia alguma coisa muito errada com o Aristides. Tomou uma decisão importante. Faria o máximo esforço para prolongar o sonho até desvendar o final. Queria saber o que aquela história tinha de verdade, o que queria dizer aquela ruptura indigesta. Aplicou-se. Tomou remédios para dormir e se entregou! Era carnaval. Não podia deixar de cumprir com seu ritual de sempre. Já tinha traçado um pequeno roteiro que incluía os maiores blocos e alguns outros das várias centenas que foram surgindo ao longo dos anos. Após dois anos sem carnaval e mais alguns sem que a tradicional alegria carioca se manifestasse plenamente, um tempo de conservadorismos primários e mal intencionados, tinha de volta o seu compromisso de vida! Mas precisava dormir mais para completar o sonho. Um paradoxo.


E o sonho veio! Mais uma vez. Pleno, integral, sólido. Com ares de cinema! Aquelas cenas bem dirigidas, com a clareza necessária para que tudo fosse compreendido sem sustos.

Tentou acordar quando o segredo se desvendou. Beliscou-se. A incontinência também o ameaçava. Precisava acordar para aliviar a bexiga. Forçou o despertar. E despertou! Vestido como um índio do Cacique de Ramos, estava no meio do Cordão da Bola Preta, fantasia errada. As pessoas olhando impressionadas, o folião meio agoniado, precisando de um banheiro. O sonho não era sonho. O Aristides tinha se libertado de sua prisão particular. E a alegria era genuína!


Quem não chora não mama...

É carnaval!!


Rio de Janeiro, fevereiro de 2023.


 

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